terça-feira, 22 de maio de 2012

O calo nosso de cada dia

Alguém por aqui tem um calo? Não refiro-me ao calo nos pés, mas aquele na garganta. Sabe? Aquele que quando ouvimos alguma coisa que mexe conosco sem saber como, já sentimos o coração saltar, as têmporas inflarem e uma vontade maluca de fazer ou dizer alguma coisa. Isto acontece quando por um motivo qualquer a conversa ou leitura cai sobre aqueles assuntos incômodos: a nossa opinião que defendemos quase como se fosse a nossa identidade. Como já disse por aqui, sou uma pessoa agressivo-passiva, não gosto de combates, vozes gladiadoras e luta de egos. Não gosto ostensivamente, mas aqui dentro fico numa indecisão se falo ou não. E se acabo por calar fico matutando por dias  o que poderia ter dito...
Não são todos os assuntos obviamente que me deixam assim. Além disto, alguns deles já passaram da defesa apaixonada e quase cega ao neutro, com o tempo. Mas quer me ver em rubro é falar de estereótipos. De brasileiro (mal). Pérolas do tipo: eu conheço brasileiros ladrões. Não podemos confiar neles, só querem tirar proveito...etc, etc. Ou falar que escrevo errado. Ou em mau português. Ou que falo brasileiro. Em primeiro lugar, não escrevo errado, eu escrevo em Português do Brasil. É a mesma coisa que dizer para um norte-americano que ele escreve em "americano" errado. A começar que não existe americano, existe o Inglês. Assim como existe o Português (de Portugal e do Brasil). Isto de leigos até dou um desconto, do tipo conversas do seu Manel do talho ou a dona Felismina das castanhas. Não dá para esperar muito de pessoas sem quase nenhuma escolaridade, apenas respeito. Aliás, exijo respeito, até porque isto é básico em qualquer lar que se preze.
Agora custa-me ver que há um pensamento tão tacanho em pessoas jovens, em uma Universidade. Dou um exemplo: foi disponibilizado também um livro em português do Brasil, pois o livro obrigatório em original está em inglês.  Estas pessoas escolheram o livro em português. Não imagino o quanto está difícil de compreender a língua. Quanto reclamam disto ou daquilo. Bem, eu não tenho Q.I. acima da média e consigo compreender plenamente um texto em português de Portugal. Tirando algumas expressões que com boa vontade pode-se entender o significado pelo contexto da frase, não vejo nenhum problema. E não desgosto, pelo contrário, gosto de ler textos tanto de um país como de outro. Acho rico esta variedade, a cultura, a troca. Não compreendo como as pessoas fazem disto um drama. Ah mas estaria sendo muito ingênua se não mencionasse uma palavrinha mágica: despeito. É incômodo. É o calo deles que roça no meu e se ninguém ceder não há crescimento. Lá volto para minha auto análise e vejo a importância do silêncio. Não o silêncio magoado que é apenas silêncio por fora e gritos por dentro. O silêncio de derrotar-me um pouco, só desta vez (10 passos dos A.A. get it?). Respiro fundo e deixo passar. Crescer, crescer, este é o caminho...devagar e sempre.

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Nosso menino está a um passo dos dois anos. Tem a parte motora muito desenvolvida (como seria de se esperar em um menino), no entanto ainda fala pouco e todas as frases intraduzíveis terminam com um carro. Não sei porque mas a palavra encaixa-se na perfeição para tudo. O pai ainda por cima resolve dizer: pacatatu, cutia não. E o filho passa o dia a repetir "paca...paca...pacatu". E a mãe briga com o pai. Ele já diz tão pouca coisa e ainda por cima isto nem é palavra! Acaba o jantar e substitui o a-ca-bou por "pacatu"!  O olá ainda está e o tau também. Fora isto há o não não não, assim, um a seguir ao outro e o ma-mãii. Já não diz mais bom dia nem licença, mas de vez em quando vê o coco do cão e resolve chamar para limpar. Aí diz coco, mas não quer saber quando o coco é o dele. Por isto, está muito longe do desfralde. ah tinha quase esquecido do famoso "caiu" ou caí como diz quando é ele. E diz isto muitas vezes por dia. É só olhar para os joelhos roxos.

quarta-feira, 16 de maio de 2012

A coitadinha

Um tempo atrás li uma coisa parecida em um fórum cuja mãe havia dito que as suas companheiras de parto por não estarem igualmente felizes, não eram dignas de partilhar com ela o quarto e o momento. Ora, se ficamos por esta de ser dignas ou não de ser mãe, podemos estender "esta injustiça" para outros lados da vida, porque não? Porque fulano que puxa o saco do chefe é promovido e o outro que faz o seu trabalho sem puxar o tapete a ninguém é despedido? Porque dá Deus nozes a quem não tem dentes? Porque continuamos a nos achar coitadinhos, traídos pelo destino? Faça me um favor menina, vá cuidar da sua vidinha que como mãe estás a recém começando, engatinhando mesmo, e depois quando deparares-te com as pedras que a vida com certeza te vai impor, julgas. 
Mania das pessoas acharem-se melhores... Ah mas eu fiz dieta dois anos, malhei duas horas por dia e to aqui, fulana já saiu sem barriga do hospital: ah vida, eu sou mais merecedora que ela! Porque 68 kgs??  Porque??
Se olhar por este prisma a vida só pode ser mesmo injusta porque recompensa os fracos, os preguiçosos, os filhos da puta, os fofoqueiros e esquece de nós. Nós, os santos, os que sempre dão 100% de tudo, os honestíssimos. Sabe o que isto parece? Aqueles queixumes de velhos e de crianças mimadas. Que invariavelmente serão os tais velhos picuinhas mais tarde. Portanto, eu que não sou mais criança, nem to velha ainda a este ponto, vamos s'imbora, levantar a cabeça e bola para frente que o jogo ainda não acabou.

Depressão pós parto

Há uma semana atrás circulou pelos sites de maior audiência, pelos perfis do facebook e emails um vídeo de uma mãe batendo na sua filha de dez meses. Daí surgiram milhares de comentários que não vou falar, mas é possível imaginar quais seriam. É óbvio que não estou aqui para defender a mulher do filme, não acho nem um pouco correto da parte de um adulto bater em uma criança ainda para mais, indefesa como aquele bebê. O que eu faço é ir mais além. É muito, mas muito fácil para quem está de fora julgar, mandar aos leões o tal culpado, no entanto não sabemos o que passa na cabeça desta pessoa para cometer um ato tão condenável. Eu tive uma depressão pós parto que perdurou por muitos meses. E vocês não imaginam quantas e quantas coisas me passaram pela cabeça. Vou tornar público porque talvez possa dar conforto a alguém que esteja passando pela mesma situação.
Imaginem que vocês queriam muito engravidar, fizeram dois tratamentos e finalmente conseguiram. Depois a criança nasce e não sentem nem um décimo da alegria que pensariam sentir. Seu corpo está desforme, sua barriga virada em uma pelanca só, seu quadril teima em não caber em nenhuma calça que não o pijama do marido, sua auto-estima está nos pés. Mas o pior não é isto. Há um cansaço, um choro constante que pede, que exige a sua atenção. Mas não disseram que era assim? Que um bebê dá trabalho? Mas também não disseram que compensava? Pois. E se você sente lá bem no fundo que não compensa. Todo aquele esforço para ser mãe e de repente a sua vida é um pesadelo entre fraldas, cheiro de leite azedo, mamas doloridas e noites em claro.
Às vezes ficava a olhar para a moleira do meu filho a latejar. Era hipnótico. Às vezes imaginava uma faca a passar-lhe. Às vezes imaginava um travesseiro em seu rosto. Às vezes imaginava passar por um contentor de lixo e deixar-lhe. Sim, eu sou um monstro, pensava. Só quero livrar-me do meu filho. E vocês não imaginam a dor, a angústia que é sentir isto e não poder contar para ninguém. Ter de fingir que está tudo bem. Que é lindo ser mãe. Que tudo vale a pena.
Por isto engordei os dez quilos que havia perdido do parto novamente. Por isto fiquei em uma cama com medo de mim. Medo de ceder aos meus pensamentos, medo de concretizar tudo que me segredavam. Estava à mercê da minha loucura. E ninguém sabia. 
Eu não acho que abusar de uma criança seja desculpável, o que está em jogo aqui é que é necessário pedir ajuda antes que se chegue a este ponto. A depressão é uma coisa séria, não é algo como ah estás gorda, mas logo voltas ao normal. É mais, muito mais que isto. E é bom saber antes de julgar.
Web Statistics