quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Cake



Jennifer Aniston nos faz acreditar durante quase duas horas que ela é a mulher mais miserável do mundo, o que é um grande feito para ela. Não vou negar que sempre tive um pé atrás com a namoradinha dos norte-americanos, e que também ela tem culpa por me sentir assim. Os filmes estilo sessão da tarde, comédias românticas em que dá a impressão de interpretar uma e outra vez o mesmo personagem. A mocinha que busca um amor, mas que finge o tempo todo que não quer se apaixonar, aí ela passa o filme brigando com o cara para no final descobrirem que foram feitos um para o outro. E o beijo na chuva? Não podemos esquecer nem do beijo, nem da amiga que fica empurrando ela para o senhor-certinho-que-acaba-não-comendo-ninguém, a festa em que ela bebe demais e faz uma loucura, etc, etc.
Em Cake a fórmula também não é nova: pega-se em uma atriz bonita e a enfeia (Charlize Theron que o diga), soma-se uma boa dose de tragédia e era isto. É o tipo de coisa que se a fulana não deslancha agora, não o fará nunca. O filme não tem o enredo pretensioso, mas é uma história que poderia acontecer com qualquer um ao virar da esquina e isto cria uma certa empatia com o espectador. Principalmente, é o primeiro em que imagino a Jennifer como atriz de verdade e não como aquela versão mulher de quarenta meio adolescente que me dá nos nervos.

Norte e Sul

Li em algum lugar que Marselha era uma espécie de Brasil na França. Talvez porque seja a cidade mais perigosa do país, talvez porque os lençóis balançando nas janelas a transforme em uma grande favela, não sei, nunca fui até la e toda vez que eu falo nisto, o Fernando solta um grunhido como quem diz que fazemos bem em continuar assim.
Saint Raphaël por outro lado, é um lugar calmo, quase tanto como Shiltigheim, com a diferença que há muito mais idosos e cachorros. Não sei bem qual dos dois tem mais. No entanto, mesmo sendo uma cidade projetada para ser o último pouso na velhice, não é uma cidade pensada para as pessoas. Tá certo que os prédios tem entrada para cadeirantes ou elevadores para quem não consegue subir dois degraus, mas não é este tipo de preparo de que falo. Falta espaço, faltam bancos para bater um papinho, faltam pracinhas para as crianças (vivo em uma zona escolar). Em toda a cidade só existem duas: uma é perto da roda gigante à beira-mar e a outra é muito longe, a uma meia hora caminhando sem o Fabian. Ou seja: quase no fim da cidade. Na Alsacia eu contava com três praças perto de casa. Claro que o fato de haver mais crianças e mais emigrantes contasse para que assim fosse, mas aqui sinto que a cidade foi feita para os ricos e seus iates, visto que não faltam marinas.
A primeira diferença que notei no Sul foi o fato de as ciclovias serem quase inexistentes e as poucas pessoas ao invés de se aventurarem entre os carros, preferem andar nas calçadas. É tão comum ver motoristas de noventa e lá vai muitos anos aqui, quanto era ver idosos ciclistas em Strasbourg. Ainda hoje olhei algumas fotos e senti uma pontinha de saudade, aquela gostosa, que dá vontade de levar para passear pelas ruelas de casas de madeira. Mas depois eu lembro do sol e do mar e já não há comparação possível. 

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Voltar

Olhei por alguns minutos o campo para preencher sobre quem chamar em caso de emergência. Conferi e de fato lá tinha escrito os telefones meu e o do pai no canto superior da folha. Não, não há mais ninguém para quem recorrer. Deixei-o ficar. Vazio.
Por diversas vezes me tinha passado esta pergunta: será que um dia vou voltar? Eu que amo tanto meu país e minha cultura... Se antes foi uma necessidade quase absurda como respirar, hoje me parece um pulsar surdo, antigo e cada vez mais fraco. Afinal, voltar para quê? E para quem? 
Aquele tempo no Brasil me fez pensar no quanto é ilusório o que considero o mais pueril de todos os laços que prendem um emigrante: o emocional. O buscar na família e amigos o seu maior motivo para o retorno. Vai ver eu tive azar. A maior parte da minha família não merece que eu tome uma decisão tão importante pensando nela. E os amigos...bem, os amigos seguem a sua vida, os que não se afastam, vão por vezes telefonar ou comentar uma foto no facebook. As minhas amigas no geral e nem tinha muitas a bem da verdade, conheceram outras pessoas e hoje eu não passo de mais um nome na lista do WhatsApp. Se eu pensasse em voltar por causa delas, estaria com as expectativas muito baixas com relação ao sucesso deste retorno.
Ninguém que pensa em voltar imagina que aquele mundo que se deixou para trás, cinco, dez, vinte anos, já não existe mais. Aquelas noites que se passaram tão bem nos bares da Lima e Silva, o xis do Cavanhas, as lojas preferidas no shopping. E se os lugares que frequentamos ainda permanecem os mesmos, a gente não. Nunca nos disseram que nós morremos em um ponto qualquer no caminho para o aeroporto. Na realidade nós não voltamos, é impossível voltar ao ponto de partida.
Para mim esta imagem romântica da "volta" se esvaneceu ao mesmo tempo em que eu abandonei estas relações-fantasma ao deixar o Brasil (novamente). Hoje penso que onde houver dinheiro, vivemos bem. Principalmente onde houver dinheiro e calor. Seria capaz de voltar para o Brasil, porém isto envolveria muito, mas muito mais dinheiro, o que eu imagino que aconteceria somente se o Fernando acertasse o Euromilhões. E quem me garante  que não iria deixar também em branco o telefone como o deixei na escola do Fabian? 

domingo, 15 de fevereiro de 2015

Não entendo

O povo passa o ano todo reclamando que não tem dinheiro, mas quando chega o verão não sobra ninguém na cidade...

A felicidade é um laço cor-de-rosa

Alguém devia denunciar isto, este eletrodoméstico do demônio. Será que algures em uma sessão de pastores rodopiantes já não o condenaram à maldição? Bastou ligá-lo sexta, para que o Fabian se transformasse em um diabo da tasmânia, aliás, esta é a forma com que usualmente o diagnostico quando o estado de excitação/má educação normal atinge à loucura. Pula, grita, acha que é um super herói qualquer. Falo trezentas vezes para me deixar limpar a porra da casa. O aspirador deve ter algum efeito hipnotizador junto com o seu barulho insuportável.  Gritei eu, gritou ele, mas nem um valente tapa na bunda o fez sossegar. Dois dias sem ir à escola por conta de uma gripe que empesteou eu e o Fernando, cansaço, anos sem liberdade, sem momentos à dois, tudo me passava pela cabeça enquanto o vácuo do aspirador enchia meus ouvidos. Quebrou a peça de encaixe que liga o aparelho ao cano de limpeza. Deve ser a raiva ou a pão durice de achar que seria boa ideia comprar um de 29 euros. Depois de minutos, chega o marido e não sabe muito bem o porquê do meu estado de nervos, já que o filho é tão querido e tal. Ontem bastou algumas horas à tarde enquanto eu deitei no quarto para ouví-lo berrando que isto não podia ser e o tal "querido" a aprontar mil e uma como se fosse uma coisinha selvagem. 
Em meio a isto lembro-me daqueles conselhos sobre educar e só me dá vontade de rir. Ponham lá o senhor ou a senhora expert em amestrar crianças à prova com o meu diabo da tasmânia um mês. Ah mas não é um mês com "escapadas" para o Dubai, com jantarzinho romântico e babá a la carte. Não, ponha lá com dedicação 24 horas, sem parentes a quem recorrer, sem dormir direito ( aqui até hoje o Fabian acorda três vezes ou mais e termina por dormir na nossa cama). Mergulhem lá na nossa vida doutores! Vão ver o quanto é enriquecedora esta experiência e se não enlouquecerem, dou-lhes um pirulito. 
É por esta razão que tenho verdadeira alergia a estes mestres da pedagogia, estes e os blogs fofinhos-rosinha-ser-mãe-é-tão-bom. No que diz respeito aos últimos, é ainda mais evidente o quão irreal é aquela atmosfera de revista que pretendem criar. A mãe fala de sua vida de uma forma tão imbecil que sinto que está falando a língua dos bebês: óin voxês naum acham qui o baby M. é lindaum?! E baby M. cheio da grife carezézima que nem assim o deixa bonito. Enfim, a mamãe blogueira se esforça, tira fotos instagramizadas, mas é um fato que os bebês crescem e deixam de ter graça. Mas não passa de coincidência quando ao perder as visitas, a cegonha venha visitá-la outra vez. Mas Bonitinha, não seria muito sem noção ter filhos só por causa de um blog? Pois eu acho que destas eu espero qualquer coisa...
 Ainda ontem falei com uma amiga que está querendo muito ser mãe, estava comentando que não entendo aquelas pessoas que acham que filho salva casamento (tendem a ser mais eficazes em blogs ao menos). É justamente o contrário! Se um casal não estiver muito certo do que quer e bem equilibrados tanto financeiramente quanto emocionalmente, sinto muito, mas é apenas uma questão de tempo (para ser a mãe a ficar sobrecarregada com aquele filho).
E se espera tanto, mas tanto da mulher e quase nada do homem, que estes dias viralizou uma reportagem de um pai não ter desistido da filha com síndrome de down. E toca aplaudir o cara por não fazer NADA mais do que a obrigação dele. Nem preciso dizer o leque de adjetivos fofos com que a mãe da criança foi chamada. Deve ser duro mesmo para o homem né, para cada centenas de mulheres que são abandonadas com filhos saudáveis ou não, este resolveu cumprir o seu papel: um grammy de super pai para ele!
E a corrente das mulheres grávidas contra o aborto? É tanta coisa que me tira do sério que é por isto que na maioria das vezes prefiro ficar quieta. Mas agora o que realmente interessa: o que eu faço com o aspirador hein? 

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

Queremos sempre uma razão

Alguém se jogou na frente do trem em Villeneuve Loubet, ele disse. Conseguiu uma carona com um colega e está vindo de carro...sabe-se lá quando terá trem novamente. Não conheço, não sei se é jovem ou velho, nem o porquê. Terá planejado ou este foi um dia em que perdera as forças de remar contra a maré? Terá alguém que deixou para trás? Filhos...esposa? Ou este talvez tenha sido o motivo porque tornara seu destino tão irreversível?
Por que? E importa? Não haverá trem por muitas horas e a culpa me assalta por sentir alívio de que ele volta para casa são e salvo.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Pornô japonês

A primeira vez que vi um filme pornô, eu devia ter uns dezoito anos e foi na casa dos meus avós. Não lembro qual das minhas primas teve a idéia  de que a senha do canal poderia ser composta somente de números  zero, mas depois disto o mundo nunca mais foi o mesmo. Não recordo bem da cena, mas lembro que rapidamente nos entre-olhamos e rimos. Seria o sexo tão ridículo como aquilo? Um homem em um vai e vem mecânico, a mulher a fazer cara para selfie, gemidos escandalosos e lá atrás um cara tocando saxofone. Por que diabos um cara toca saxofone enquanto os outros fazem sexo?
E se ele não aparece, pelo menos completa a trilha sonora. Sim, porque é só ouvir um jazz para logo pensar em sexo né?

O kama sutra musical...

Já faz um tempo que fiquei sabendo que não somos a única espécie a fazer sexo por prazer: dizem que os golfinhos também  fazem-no e os bonobos...ah os bonobos é outra história. São um gênero  de macacos que baseiam sua vida  no dito "faça amor, não faça guerra". Disputa por comida: sexo é a resposta. Disputa por território: vamos fazer sexo antes? Disputa por fêmea: que tal todo mundo junto? Tédio? Carência? Isto mesmo, os bonobos resolvem todos os problemas com sexo, o que faz com que no fim praticamente não haja agressividade entre eles. Bonobos, vocês são uns fanfarrões!

"Aqui de boas imaginando se a humanidade pensasse como nos". 

E acredito que sim, os diretores de filmes eróticos podem muito bem terem se inspirado nos nossos amigos primatas quando desenvolveram os seus scripts. Um motoboy aguarda o pagamento da pizza, mas a mocinha não tem dinheiro, então... Uma diretora resolve dar uma bronca na secretária  depois do expediente e...  O professor descontente coloca a aluna de castigo daí...
Hoje tive a oportunidade de ver um filme japonês meio tosco, não sei se são todos assim, mas achei um pouco diferente do que já tinha visto, mesmo tendo  iniciado com o clichê  da garota colegial. Era para ser uma filmagem amadora, meio estilo taradão do metrô, e todos os rostos e órgãos sexuais estavam protegidos por quadrinhos menos o da jovem. Mas isto nem era o mais bizarro, a lágrima e o beicinho que ela fazia entre o querendo e o afastando. Milhares de closes na lágrima me fizeram questionar  a quem estava destinado deliciar-se com aquilo. 
Acho interessante pensar sobre o que nos excita, acredito mesmo que isto seja uma ponta do inconsciente, a mais óbvia talvez. E por mais esquisito que pareça, me intriga saber até que ponto nossos desejos descendem da cultura a qual pertencemos e até onde são partilhados pela humanidade.  Sabendo que para muitas tribos (tanto brasileiras como africanas), as mulheres acham simplesmente hilário que nossos homens sejam adoradores de seios, pois estes servem apenas para nutrir os filhos; e sabendo que na grande parte de filmes o sexo vendido é um pornô plastificado, feito por homens musculosos com membros enormes e mulheres de cabelos descoloridos com bóias ao invés de peitos, que sentimentos são despertos na hora do sexo? Que partes foram através dos tempos perdendo ou ganhando caráter erótico? Por que o proibido, desajustado ou renegado socialmente são os maiores ímãs  para as fantasias sexuais? Mas já dizia Nelson Rodrigues; 

"Se todos conhecessem a intimidade sexual uns dos outros, ninguém cumprimentaria ninguém".


segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Prólogo

O pulso estava nu. Havia despido o relogio que ele lhe dera no seu aniversario. Olhou brevemente para o espelho salpicado de pequenos pontos de pasta de dente e desta vez não sentiu o impulso de limpar. “Para quê?” O primeiro que deparasse com a cena certamente não ia preocupar-se com aquela mancha, mas por certo repararia no rio avermelhado escorregando de seus braços. Toda a vida escorrendo por azulejos brancos, se entranhando nos rejuntes que ela esfregara semana passada. Cada gota guardaria algum momento passado? E se guardasse, à medida em que lhe iam abandonando, a cabeça ficaria mais leve ante o inevitável?

Catherine  tinha a mão trêmula quando agarrou na lâmina; poderia ter escolhido qualquer faca de cerâmica  da cozinha, mas escolheu o canivete suíço: ele garantiu-lhe que jamais a deixaria na mão. Soltou um riso torto, no eco do banheiro pareceu mais com um grunhido do que um som humano. Queria que sofresse.
Iria ao menos vê-la neste dia? Ou mandaria uma floricultura entregar coquelicots pela internet enquanto comia uma qualquer puta de uma atriz americana? Ou em um dia bom, telefonaria para que segurassem o enterro até a hora em que tivesse acabado as cenas às margens do rio Drá? E depois? Depois…
Encostou a cabeça levemente sentindo a parede gelada provocar uma onda de arrepios pelo corpo todo. Os bicos dos seios beijaram o forro da camisola de cetim e de um rasgão da pele branca brotou uma fita vermelho escura. Fechou os olhos torcendo para que o tempo escoasse depressa, mas quando tornou a abri-los, encontrou tudo no mesmo lugar exceto por duas gotas no chão.
Olhou novamente para o canivete e viu que ainda não havia resquicio de sangue, moveu-o fazendo o reflexo  iluminar-se como uma estrela presa em seu espelho. “Não consigo.” Não pusera força suficiente para tal. O calmante começara a fazer efeito e Catherine sentia a cabeça a encher-se de líquido. Em breve lhe taparia a boca, os ouvidos...e quando chegasse aos olhos seria tarde demais.  
Bamboleou para o quarto fazendo o possivel para não olhar para cima. Sentia os seus olhos postos nela. A penugem dos braços tornou a eriçar-se, tropeçou em um par de sapatos ao pé da cama e por muito pouco conseguiu evitar os dentes de se encontrarem com o piso. Mesmo com a luz apagada e somente um fio dela vindo da porta do banheiro, conseguia sentir o meio sorriso de troça por cima dos ombros.
- Você - explodiu em soluços - Está feliz agora? Eu devia pegar isto e lhe furar a cara...que acha? 
Agarrou debilmente a lâmina e pôs-se a subir a cama arrastando-se. A cada centímetro seu pulso depositava flores carmim nos lençóis. Coquelicots. A meio metro de chegar até ele, fraquejou. Era como se todo o seu corpo se tivesse enferrujado e seus membros não mais lhe pertencessem. Foi sentindo os olhos pesados.
- Não...não...eu tinha...que acabar...com isto...
Ergueu o dedo para ele. La do alto o homem observava, escondido e sorrindo. Ha séculos sorrindo.

sábado, 7 de fevereiro de 2015

Se...



Eu falasse tudo o que penso não ia prestar, então prefiro ficar quieta. Estou em um momento sem paciência nenhuma, sem empatia nenhuma com ninguém. Estou ansiosa para que um projeto que sonhei por mais de meio ano se realize e esteve quase, mas infelizmente vamos ter que adiar por algumas semanas. São apenas três, procuro me acalmar...depois acabo por pensar que são mais três semanas longe do meu objetivo. E volto a me irritar como se tivesse sempre à espera de outro imprevisto. 
Estive entupida, cheia de palavras agarradas na garganta. Uma das coisas que me fez perder um pouco o interesse de falar por aqui, foi a desconfiança que um familiar do marido andasse xeretando, e se eu não quero que a família dele saiba da nossa vida, porque colocar aqui de bandeja? 
Enfim...não vou desistir, sei que depois vou sentir-me melhor. Só mais um pouquinho de paciência...

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