Sei que sou uma drama queen, e tenho tendência a encarar tudo que passa na minha vida com a potência máxima. Mas uma coisa me aflige sempre que noto o coração mais duro. Antes eu pensava que o sofrimento me tornaria mais solidária, mais consciente, talvez mais agradecida se observar que há sempre alguém em pior estado que nós. Mas o sofrimento surpreendeu-me. Pelo contrário, sinto-me mais egoísta, mais mesquinha, mais impaciente e muitas vezes sem nenhuma vontade de me dar ao trabalho de empatizar com quem quer que seja.
Tenho tendência a minimizar os problemas alheios e tenho reparado que o marido também anda assim. Não são dois meses, são quase 9 meses desempregado, muita coisa se passou e não é rapadura. Quando as pessoas pensam "ah mas pelo menos tem saúde ou isto não é nada, logo vocês vão ter a casa de vocês", vem-me fogo nas ventas. Isto porque estes dias quase chorei a falar que não há pior coisa no mundo do que não ter a nossa casa. E as lágrimas e o turbilhão de emoções me atingiu em cheio a barreira desta represa que tão habilmente guardo. Foi como um soco. Pah, bateu nos olhos e voltou. É nestas horas que percebemos o peso invisível que carregamos. Os outros sempre tem um palpite a dar, uma coisa que devemos fazer. O marido a trabalhar de garçom ou a ganhar mil reais como um jovem inexperiente na sua área. Já pensaram que é um homem de quase 60 anos a recomeçar? Já pensaram que não tem 30 e que não pode se dar ao luxo de agora entrar em um emprego destes para mais tarde pleitear um salário melhor? É que não há tempo para rodeios. O Brasil exige juventude. Os patrões querem pagar pouquíssimo aos "sêniors". Como a minha mãe disse um dia: tá mas não vão poder ter carro, mas isto não mata ninguém. Isto vindo de uma pessoa que enche o tanque de um corolla 1 vez por semana, às vezes 2.
Não é porque me ponha a olhar para as estrelas que o meu problema vai ser menor. Ele vai continuar tão e só do mesmo tamanho que está e proporcional com a atenção que lhe dou, ou seja, muita. Porque? Vejamos porque é uma merda depender de alguém, mesmo que seja parente. Porque é uma merda não ter casa, não ter o filho na creche (qualquer dia destes enlouqueço), não ter carro. Ter sempre alguém a julgar o que fazemos porque se fazemos é porque temos dinheiro e que não devíamos fazer isto ou aquilo, como se tivéssemos com passagem marcada a Nova Iorque. Porque ao virar do mês vamos nos separar e não sei quando iremos nos reencontrar. Porque é um pai que ama muito este filho, mas não vê saída a não ser ganhar esta França afora e até a Europa em busca de um emprego decente. Porque tenho que dizer milhões de vezes à minha mãe que não vou fazer concurso, que não vou fazer faculdade aqui porque a minha vida é ao lado do homem que eu amo. Porque os outros não tem sensibilidade nem sequer passaram por coisa parecida e portanto acho-me no direito de também não querer saber do resto do mundo já que ele me virou as costas. Infantil? Muito. Mas nunca estive aqui para bancar uma de mulher-superação, sou assim digamos...imperfeita.