sexta-feira, 8 de março de 2013

Tão eu


Eu via

Ando sem vontade para ver os mortos. Faz tempo... Não quero que me visitem, não quero que me apareçam na frente da cama, não quero que me venham tirar à força do corpo. O corpo é meu e eu saio quando quiser! Entenderam?
Sou cagona, extremamente cagona para estas coisas e preferia não ver nadica. Em Portugal acontecia muito de acordar de madrugada e ver alguém no quarto a olhar para mim. Outra vez tive mesmo de gritar e acordar o marido, pois tinha uma velha em cima dele a lhe puxar os fluídos vitais pelo nariz. O marido quase tinha um ataque cardíaco quando fazia destas, mas ficava completamente apavorada e esta era a minha reação mais rápida. 
Lembro-me de uma vez há uns dez anos atrás estar dormindo na casa da minha vó, no quarto que pertenceu a minha tia. Detestava dormir ali, tinha sempre medo. Às vezes eu ia de travesseiro e tudo e pedia para o meu vô dormir lá e ficava dormindo com a vó. Cansei de fazer isto. A minha mãe pirava quando até os 12 anos ia dormir no chão do quarto dela se acordava no meio da noite. Pois então estava lá dormindo e de repente acordo-me com a intenção de me virar e quando abro os olhos dou de cara com um homem a me olhar. Fiquei sem reação. Nem sei como não me caguei toda. Ele me olhava e não desaparecia quando piscava os olhos na tentativa de me convencer de que não passava da minha imaginação. Ele estava sentado ao meu lado, literalmente ajoelhado sobre mim, com o rosto muito muito perto. Tinha olhos azuis, mas como eu poderia saber se estava escuro? Não sei, mas tinha e era branco com o cabelo castanho claro. E estava nu, ou pelo menos com o dorso nu. E me olhava com curiosidade, com calma. Não tentou dizer nada, apenas olhava e tinha até olhos serenos. Devo ter pensado em milhonésimos de segundos "o que tu quer de mim". Antes de sair correndo para o quarto e obrigar o vô a dormir naquele quarto. Depois falando com uma amiga que partilha das mesmas crenças espíritas, ela solta um palpite: acho que era o teu filho. Geralmente visitamos os nossos futuros pais antes de encarnar, mesmo que na Terra pareça que faltasse muito, uma década, o tempo no mundo espiritual é vivido de forma diferente. Pode ser que tenha sido, até recordo-me de um sonho quando ainda estava grávida em que um jovem me pedia para chamá-lo de Adrian porque era o seu nome e não de Fabian como eu pensava e de fato coloquei no meu filho. Enfim...há muitas coisas entre o céu e a Terra, se há.

Polêmicas e mais polêmicas

Ora bem, levante aí a mão quem gosta de ser criticado! Levante mais alto quem gosta de ouvir sermões da montanha, moral de cueca, e a tal explicação do "refletes que é para o teu bem", ou o tal "ah mas ouvir umas verdades, dói não é?". Falem honestamente, quem em sã consciência gosta disto?  E quantas vezes não somos obrigados a conviver com a contrariedade e com os pitacos que os outros dão na nossa vida? Poderia estar falando de mim, mas estou falando de nós, nós os blogosféricos que temos a nossa casa virtual e gostamos de receber visitas diárias. Aconteceu em um blog que sigo, uma opinião se transformar em um espicaçado de comentários e contra comentários, por uma coisa tão boba minha gente. Uma coisa que todos temos, não não é bunda. É preconceito. É feio né? Mas é nosso e não adianta esconder, ninguém é tão liberal quanto pretende parecer. Em certa medida somos todos preconceituosos e ignorantes. Porque? Simplesmente porque somos humanos e a nossa existência não consegue abarcar tantas realidades e "verdades" mundanas e intelectuais. Em certa medida vamos ignorar grande parte das etnias as quais julgamos, dos países que chegam apenas por notícias parciais e inclusive de, como chamamos aqui, das "tribos" urbanas que ocupam conosco o mesmo espaço. Conhecimento total e absoluto da realidade é uma coisa que de fato nunca teremos, portanto "verdades" tão levianamente jogadas em comentários é deprimente porque só revela a auto-ignorância em que nos encontramos. Alto lá, uma coisa é discordar do argumento, outra bem diferente é fazer juízo do que eu penso como sendo o que o outro É. O problema é que as coisas confundem-se e as tantas já deixamos de ter a nossa opinião aparentemente neutra e passamos a atacar. E porque a surpresa quando é isto que fizemos ao longo de milhares de anos para nos fazer valer o nosso apreço aos demais? A evolução de hoje não é a daquele que mantém o fogo aceso, a evolução hoje é a do que usa este fogo para iluminar-se e crescer.

quinta-feira, 7 de março de 2013

O colecionador de mágoas

O corpo fala, filho. Tenhas certeza disto. Tu podes achar que não proferiste uma só palavra, mas ele trai-te desde o princípio, desde o primeiro choro até o último suspiro. Eu digo-te que fala e age conforme a petulância do teu coração. E como, perguntas-me. Lembra de algo que te incomoda, vês logo o teu peito a galopar, tens uma pontada no estômago, um tique no pé. Doem os dedos, estalamos como gostaríamos de fazer com alguns pescoços por aí. E não, nós fingimo-nos de surdos a cada vez que ele fala. Parece-nos que quer nos tirar o brio de civilidade e nos transformar em segundos em macacos selvagens de corpo nu. O corpo quer-se nu. Ele fala e nós não o escutamos. Teimamos e ele também teima por sua vez. Duas pessoas conversando são dois corpos falando ao mesmo tempo. Ganha quem souber ler o outro, quem parar de fingir e ouvir as mãos, os nós mal resolvidos. Ganha quem calar. Em suma. E é só. O corpo fala e trai-te. Quanto mais cedo perceberes, filho, mais saberás de ti e dos outros.
Sabe porque a arte é tão exagerada aos nossos olhos? É porque não tem pretensões para com a vida. A arte não imita a vida, não aquela que conhecemos. A arte imita o corpo. E daí que a notícia de uma morte causa um desmaio. Já viste lá alguém desmaiar quando outro morre? Eu não. E quando em desespero um sujeito se joga ao mar de roupa e tudo. E outro vomita quando uma situação lhe causa asco. Não, filho, ninguém o faz. Por acaso este teu velho pai aprendeu que há memórias que não se evocam, que há filmes que não devemos rever. E no entanto revemos. Sonhamos, sofremos, odiamos tudo outra vez. E a cada volta o corpo fala, aperta-nos com sofreguidão. Porque não o escutamos agora? O corpo não sabe do tempo, acha e vive como se fosse da primeira vez. Como se pudéssemos mudar naquele instante o que já é passado. O corpo não possui gavetas como eu para colecionar mágoas, pois se gavetas tivesse, estariam todas, filho, rasgadas ao chão até o último dos sentimentos.
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