quarta-feira, 20 de março de 2013

Luca

Quando tinha dezeseis anos tive um namorico com um rapaz um ano mais novo. Nos conhecemos na evangelização de jovens no centro espírita, mas foram apenas algumas semanas até ser trocada por uma menina mais jovem e bonita do que eu. Nunca mais o vi, também nem quis, porque muito tempo fiquei magoada pelo que aconteceu. Em um fim de semana ele terminou e no outro apareceu de mão dada com outra, enfim... Os anos passaram e conheci o meu atual marido, ainda namorávamos à distância quando em pleno sábado às 7 da manhã toca o telefone. Atendi ainda dormindo e com o habitual "alô? quem deseja?". Do outro lado da linha, uma voz familiar, a tua mãe, ela disse. Eu falei, olha ela está dormindo... Depois a mulher caiu em um choro convulsivo. Titubeava. É que o Luca morreu. Mais choro e alguém lhe tirou o telefone e a ligação caiu. Até hoje juro que fico com remorso de não ter tido uma reação mais humana e ter chamado a minha mãe às pressas. No entanto uma coisa é imaginar-se em uma situação outra é vivênciá-la. Fiquei em choque. Como pode um jovem morrer assim? De repente pareceu muito errado ter sentido raiva, mesmo que a maior parte desta tivesse esmorecido. Ele havia batido com a cabeça em um meio fio, ao menos foi o que havia dito antes de desligar. 
Mais de dez anos depois, volto a reencontrar a mãe dele e fico na dúvida se peço desculpa. E também se toco no assunto. A pobre mulher de três filhos apenas restou-lhe a mais nova, já que o filho do meio morreu aos 11 anos. Pergunto-lhe se tem notícia do Luca, sabendo que ela fala nos filhos com naturalidade e que também frequenta o centro espírita. Ela disse que sim e questionou-me o que sabia da morte dele. Só sabia que tinha sido drogas e é isto, foram as drogas e a falta de vontade de permanecer neste mundo. Ele suicidou-se com um coquetel e a namorada ajudou-o, ainda a mesma menina por quem havia me trocado anos antes. 
Sabendo o que acontece aos suicidas temi que tivesse ainda perdido a vagar e sofrer, mas ela tinha um sorriso, triste, mas ainda um sorriso. Tive notícias dele pelo seu protetor espiritual, ela disse. Ele não estava em condições de falar porque já havia reencarnado. Então toda a história fez sentido. A mãe sonhava frequentemente que ele fugia para lugares horríveis e que ela o trazia de volta. A ex-cunhada (já que separou-se do marido há algum tempo) teve um sonho em que estava em Gramado com o Luca e o perdia de vista. Acordou desesperada como se o sobrinho ainda ali estivesse. Alguém lhe comentou que isto poderia significar gravidez, mas ela com duas filhas moças não queria mais filhos. Pouco tempo depois descobriu que esperava um menino. No dia do parto aos cinco minutos de vida, o bebê teve uma parada cardíaca. Depois de muito insistirem na reanimação foi ligado aos aparelhos, os médicos diziam que parecia não querer viver. Adiaram a decisão de desligá-lo até que ele reagiu, no entanto a falta de oxigênio originou sequelas: o menino é surdo e mudo. Hoje tem quatro anos e ela mostrou-me as fotos no perfil da cunhada. A semelhança é aterradora. É a cara do Luca, os olhos verde-água, o queixo comprido, o sorriso, o cabelo loiro escuro. Não tem nada dos pais biológicos.
A vida dá-nos aquilo que semeamos, é justo. Nunca conseguiria acreditar em Deus se não acreditasse que temos muitas chances para acertar. Nunca me passaria pela cabeça que há um Deus justo por trás do sofrimento das crianças inocentes e cego aos miseráveis em caráter. Porque aqui fazemos e aqui pagamos.  Emmanuel, mentor de Chico Xavier, dizia: nós somos herdeiros de nós mesmos. Nós colocamo-nos na situação em que nos encontramos e mais ninguém. Nós escolhemos os pais que necessitamos. E cabe a nós todo o esforço que muitas vezes jogamos a Deus.
Ouvir esta mulher foi um soco no estômago, logo eu que tanto tenho me revoltado e reclamado da minha vida, que afinal fui eu quem escolhi. Ela tantas vezes dizia ao Luca que não adiantava se revoltar e que desistir é muito pior... Cada palavrinha caiu em meu ouvido e fez eco. Senti tudo como se fosse para mim: Luca, só tenho a agradecer pela tua história, espero do fundo do coração, que tu neste novo corpo, nesta nova família e com outro nome, possas recomeçar. Seja feliz, Luca. Não desista de ser feliz...

terça-feira, 19 de março de 2013

Adeus verão


E é assim,  há duas semanas, desde que o marido se foi, o sol e o calor resolveram também abandonar seus postos. Vento, chuva, mais vento, frio e estamos entre 13º no mínimo e 24 º de temperatura máxima. Parece que é mesmo a hora de se despedir dos shorts e manga curta. Ainda tenho esperança que por um acaso vá sair um dia mais quente, porém acho que em vão. Este verão começou cedo e terminou cedo também. Porque ele tem tanta pressa?...

A minha solidão


Sou uma pessoa que aprecia a solidão. Não sou do tipo morar no meio do mato, sem shopping nem nada por perto, mas gosto do silêncio. Gosto de falar sozinha, de cantar enquanto lavo a louça, de passar o pano no chão a contar os meus sonhos. Quando fui para Portugal senti falta da família, é verdade, senti falta de alguns amigos e também da minha terra. Não que fosse uma pessoa muito social, de encontros e baladas, mas gostava da sensação de que se eu quisesse era só ligar para alguém e combinar um cinema. Lá por muito tempo fomos apenas os dois, ainda que o marido tivesse amigos, cada um tinha a sua vida e uma vez ao mês nos encontrávamos para um jantar.  E era só. 
Como não trabalhava, a minha tarefa era cuidar da casa e das contas. Tinha tempo para ir na ginástica, para escrever, para ver filmes e, quando o marido chegava,  já tinha saudades de falar com alguém. Era feliz todos os dias, não durante o dia todo, mas por muitos minutos destes dias. E fui acostumando-me com isto, com o telefone mudo e as amizades virtuais, até que depois salvo raras exceções, as amizades foram se esvaecendo conforme a distância entre um email e outro aumentava.  A família foi quase o mesmo processo, chegou um momento em que a saudade não doía mais, algo havia cicatrizado em mim. Às vezes por distração, passava a mão na ferida e a saudade não gritava, estava também ela confortável com a minha solidão. 

Entonces...


Porque será que a maioria das dançarinas tem aquele pneuzinho na barriga? Pensava eu que a dança do ventre fortalecia os músculos do abdomen e assim a tal pancinha sumiria. Porque não some?

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