quinta-feira, 25 de julho de 2013

And the Oscar goes to...mom


Um dia ao falar do desejo que tinha de engravidar, um conhecido disse-me: não te isoles, sério, não faças isto. Na hora fiquei estupefata com o comentário porque não percebia a relevância deste conselho. Não me isole do que? E é como aquelas coisas na vida em que só passando pela situação para entendermos, afinal ser mãe a tempo (quase) inteiro é muito complicado. E arrisco-me a dizer, que é muito mais fácil a mãe que sai para estudar ou trabalhar do que a que fica em casa com seu(s) rebento(s). Isto porque a mãe que sai, respira novos ares, obriga-se a se recompor de noites mal dormidas, coloca uma base e um gloss e uma roupa no mínimo apresentável e ah, muito importante: penteia até o cabelo! A mãe que fica em casa, na minha opinião (que não quer dizer nada de verdades absolutas, não passa do meu ponto de vista), merece uma menção honrosa ou medalhas ou como acontece em Portugal, seu nome no quadro de honra. Geralmente a mãe que fica em casa, passa o dia tentando arranjar maneiras de não enlouquecer, tal como um náufrago com o olhar perdido no horizonte salgado, com a diferença em que neste caso não há tempo para olhar para o mar (ou relógio). As horas ora curtas ora vagarosas quando se aproximam da chegada do pai, a limpeza da casa, o preparo da comida, o cuidado da roupa fariam-se com o pé nas costas se não fossem os filhos. Os berros, as birras, as  fraldas, quando não são fraldas são xixis, mãeee limpa, mãe fome, mãe colo, mãe sede, mãe desenho, mãe dodói... 
A mãe cansa, às vezes grita por dentro senão grita por fora e cansa-se mais. Às vezes o dia passa e ela dá-se conta de que não fez metade das coisas e que ainda por cima mal cuidou de si. Olha para as fotos das amigas sem filhos ou com filhos crescidos muito joviais em jantaradas e pensa na última vez que saiu com uma delas que fosse para tomar um inocente café. 
As mulheres modernas reclamam da vida agitada, de como é difícil conciliar trabalho, cuidados da casa e maternidade e dou-lhes razão. No entanto acho que não se compara emocionalmente falando com as mães  que ficam em casa com filhos pequenos. Porque como disse, o problema está em isolar-se, em deixar-se naufragar em um oceano de fraldas e choros e músicas histéricas de desenhos animados. O problema está em conviver pouco ou quase nada com gente adulta. Está em esquecer-se no desespero das urgências do cotidiano. O problema está em achar que está tudo bem e que ser mãe anula automaticamente todos os papéis anteriores. O problema está em quando finalmente consegue dar uma escapadinha, ficar se martirizando pela má mãe que está sendo por necessitar de momentos longe das crianças. 
Agora entendo a importância de não se isolar. Entendo infelizmente tarde demais, depois de ter passado inclusive por uma depressão. Ser mãe não mudou em 180º a minha vida, não me fez alcançar o nirvana, nem andar sobre brasas. Tenho só um e pretendo continuar assim, porém não deixo de amirar ou às vezes achar loucura vá lá, quem tem mais que um filho e ainda por cima seja mãe a tempo integral. Sério, merecem um Oscar!

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Dicionário das ruas #1

Botecar: prática frequente de saídas com destino a botecos (tascas)

Baranga: mulher feia, diz-se daquela que também tem modos rudes.

Embarangar: ato de envelhecer precocemente, mulher de carnes caídas e/ou mal cuidada.

Piriguete: mulher geralmente jovem que usa poucas roupas ou vestimentas chamativas, assim como acessórios espalhafatosos. Diz-se também mulher atiradiça. Vulgo perua.

Baranguete: mistura de baranga com piriguete. Mulher feia que se acha gostosa.

Exemplo de piriguete: Suelen (Ísis Valverde) em Avenida Brail.

Cidades

A minha cidade é feia, já aqui o disse. É feia e me dói admitir porque é quase como dizer isto de um filho ou de alguém que se gosta muito. Ando pelo coração da cidade perdida entre prédios altos e de fachadas decadentes. São como velhos curvados pelo tempo e pelo vento minuano. O centro é uma porção de ruas pousadas em morro e descidas íngremes, uma paisagem cinzenta e viva simultaneamente. Vozes anônimas cantadas, gritadas, resmungadas, adquirem o tom da própria voz da minha cidade. Passam todas elas em coro, ecoam em suas artérias pululantes, alguém vende ouro, alguém quer que eu venda meu cabelo, alguém oferece preços atrativos, alguém anuncia consultas para colocar aparelhos ortodônticos. Daqui a nada começam a anunciar, "ólhó promoção de silicone: prótese 230 ml na hora, na hora!". 
Os ônibus e carros circulam oprimidos em um mar de cabeças. Avançam e cortam obstáculos ao sabor da correnteza. É com uma ponta de desânimo e relutância que junto-me à maré. Faço a minha parte. Faço-me cidade e incorporo concreto e asfalto, de minha pele brotam paralelepípedos, de meus olhos janelas espelhadas. No meu sangue pulsa o Guaíba inteiro, de meu calor, agora o frio. Sou assim, um Porto Alegre cinzento de outono. E ainda dizem que as cidades pertencem às pessoas... não, as cidades é que as tomam para si e faz parte da vida esta inconsciência de que se é coletivo.
 Aos poucos preparo-me para deixá-la outra vez, ela se ressente, sinto-o. Não quer ver ninguém partir. Quer saber se volto e preocupa-se se lá onde vou outra cidade me irá acolher. Digo-lhe que não sei com a incerteza que me é costumeira, não sei de nada, nem do último olhar que lhe vou deitar quando estiver ao céu. Vejo meus punhos cerrados, misturo-me. Já dentro de mim Lisboa eriça-me a pele com as calçadas de calcário e basalto. Duas cidades disputam meu corpo, meu coração. Reviro-me, tenho a alma em carne viva. Meus pensamentos nadam em ruas fantasmas, sem minha história, sem memória de mim. Há o medo que escorrega entre pedras, há um medo aqui dentro, um medo sem fim. 

O bicho papão da solidão

Lembro-me de um dia enquanto estávamos abraçados desfrutando daquele silêncio em que quase não é preciso dizer nada, olhei para ele e sorri. Ele sorriu de volta e perguntou-me se estava gozando com a cara dele. "Não...sabe porque tu nunca vai ser rico?" Não, porque? Porque neste mundo não existe perfeição". Demos risada, e por certo achou que era mais um dos meus exageros, mas falei-lhe com todo o coração. Claro que o marido não é perfeito, mas dentro de seus defeitos consegue ser uma pessoa de convivência muito fácil, não é de discussões, é gentil, ainda é daqueles que abre portas para passar e de deixar a última fatia de queijo para mim. 
Quando olho a situação das amigas mais próximas, sinto um nó no estômago porque sei o quanto elas passam trabalho com as suas relações. Tenho por exemplo duas delas que simplesmente não se separam porque tem medo de estarem sozinhas. Uma porque tem de voltar à sua terra e recomeçar, morar na casa da mãe, procurar emprego, etc... e outra porque apesar de ser independente financeiramente, tem medo de dormir sem ninguém para lhe fazer companhia. Esta última perguntou-me se eu aguentaria o tranco da solidão, antevendo a cara que fazia enquanto contava-me a pseudo-quase-separação. Respondi-lhe que seria muito difícil e que às vezes penso nisto, não como uma situação de divórcio, mas de viuvez. E acho normal que estas coisas me passem pela cabeça por motivos óbvios. Ia ser terrível, mas muito mais porque nos amamos, não por uma situação em que este já não há e resta apenas a insegurança. A isto imagino que o mal já está feito, está presente e não é a forma de um corpo ao lado da cama que prova o contrário. Este vazio, este medo de recomeçar, juntar os cacos da frustração acumulada deu um amor que já partiu ou quiçá nunca houve, é duro, não digo que não seja. Esta mania das minhas amigas também em procurarem homens que agem como filhos colabora para isto. São mulheres desorientadas e com medo do próprio medo, vivem em sombras de momentos felizes porque não conseguem fazer o luto de um casamento. Sinceramente não queria estar no lugar delas, sei das minhas limitações e é por isto que agradeço todos os dias pelo marido que tenho. Ah não é rico nem lindo (já foi muito), não é jovem, mas é um homem bom, e que sabe ser filho, ser pai, amante e homem na medida certa do meu coração.
Web Statistics