quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Todas as noites


A minha vizinha tem um relógio. Ou deve ser uma máquina do tempo pelo barulho que faz. Engraçado só ouvir à noite, ou deve ser porque ela só funciona estas horas. Pensando bem, pode ser uma máquina de sonhos, pessoas a quem falta imaginação devem ter uma destas. O meu marido não tem, e não é porque ronca, é porque de fato tem imaginação a escorrer pelos cantos da boca e pelos olhos, sempre voltados para alguma realidade paralela qualquer. 
Quero bater na parede com os cotovelos, este barulho ritmado me irrita. Não posso dormir com esta máquina ligada seja de tempo ou seja de sonhos. Eu quero ter os meus em paz e silêncio. Já pensei que podia lá a coitada sofrer de alguma doença respiratória e precisar de uma engenhoca para mantê-la, mas aquilo não é como um tilitar comum, é rápido, é agoniante. Pus minha orelha para espiar. É mesmo dali. Todas as noites tenho de convencer-me de que é apenas minha imaginação, não há ruído nenhum ao lado. Viro-me e reviro-me no travesseiro. E se for uma bomba-relógio? Aperto meus olhos. E se eu tivesse o poder de quebrar esta merda só com o pensamento? E esta desgraçada, amanhã vou bater na porta e pedir para a mãe dela o meu sono de volta. E se ela disser que não tem relógio nenhum? E se eu estiver ficando louca? E se ao menos aquela porra explodisse e eu pudesse finalmente dormir?

Tudo que eu gosto é ilegal, imoral ou engorda

Sério que quando li isto, mentalmente escutei todos os sermões que a minha mãe diz sobre a comida. Sinto muito, mas não consigo me abster destes pecados. O negócio é suar a camisa mesmo e até agora tem corrido bem.


terça-feira, 6 de agosto de 2013

Datas


Às vezes penso que me assemelho a um presidiário a quem será dada a liberdade em poucas semanas. Organizo mentalmente o que farei, o modo como vou deixar-me ficar embaixo do sol sentindo o calor de cada centímetro de pele. O cheiro da brisa de verão, os sorrisos, a terra molhada. O cheiro das cores, sim, tem cheiro e um cheiro doce, daqueles perfumes de vó. 
Conto os dias, as horas, construo imagens como se estivesse prestes a estrear minha vida. Os personagens embaciados na película. Os abraços ainda precisam de mais ensaios para que saiam com a pressão certa desta saudade de quase meio ano cultivada. De repente as coisas aqui já não tem graça, é uma sucessão de dias monótonos em tons pastéis, tornei-me mesmo fadada à mesmice. No entanto, tal como um prisioneiro  ao mesmo tempo que odeio estar em parcos horizontes, tenho medo de como vai ser quando as portas atrás de mim se fecharem. Ecoarão fundo um rangido de liberdade que assusta, pois que a liberdade tem um quê de caos que já não estou mais habituada. 
Risca-se o tempo com pedaços de giz, primeiro o aniversário do Fabian, depois o dia dos pais, depois mais uns palitinhos e...Paris espera por nós. Enquanto isto espero, espero e espero que ainda dê tempo para um final feliz.

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Até que enfim

É amanhã que o marido põe as suas mãos grandes na chave da nossa casa. E a partir de domingo entram os armários do quarto do Fabian, a nossa cama, a cozinha, etc, etc. Nestas horas a gente vê que ter carro não é um simples capricho, ter carro é fundamental. Muitas das coisas que vi pela net em segunda mão poderíamos ficar se não fosse o impeditivo de que em algumas aldeias não exista transporte público e sem o marido ver primeiro e sem alguém para fazer o frete, nada de negócio. Ter de pagar no mínimo 50 euros a cada coisa que se compre é caro, saindo às vezes mais a pena comprar em lojas que entregam em casa e tem-se um produto novo. Temo que só daqui um ano a gente consiga comprar um carrinho... até lá nos viramos assim. 
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