segunda-feira, 10 de março de 2014

Fiz um trato comigo.

 Estou deixando para lá o "je ne sais pas parler français". Quando alguém me aborda e não sei porque, mas tem aumentado cada vez mais como se o universo todo soubesse da minha decisão, eu me viro. Falo francês com inglês, faço gestos e às vezes até falo em português. Estes dias um homem perguntou-me onde ficava a Mairie quando eu estava quase chegando com o Fabian em casa. Poderia ter dito que não havia entendido só pela preguiça de ter de me "débrouiller", ensaiei, me enrolei toda. Parece que quando estamos aprendendo uma língua surge uma gagueira sei lá de onde, mas consegui. Levei o homem até avistar a ponta do prédio que é bem próximo de onde moro e ele seguiu sozinho com as minha indicações. Ele perguntou se eu falava espanhol, talvez pelo sotaque ainda dismorfo, mas ao saber que falo português, jogou-me em alto e bom som um "obrigado". E eu completei em pensamento "merci a vous". É, decididamente  eu falo francês, mal, mas falo.

domingo, 9 de março de 2014

Le Carnaval


Às vezes eu penso que moro tão no fim do mundo que até o carnaval chega atrasado. Acontece que como aqui não tem feriado, o pessoal tem de se virar mesmo é nos finais de semana e assim, chegou a vez do Bouc Bleu dar o ar da graça em Schiltigheim. Carros alegóricos puxados por tratores, confetes, balões e saquinhos de pipoca para o público. O carnaval apareceu eclético e um tanto desconexo. Das bandinhas alemãs, ops alsacianas com um toque de techno ou de rock, às cheerleaders vestidas à moda da oktoberfest, sorrisos chochos ou tímidos e um adeuzinho com o braço. Alguns arriscavam um mexer de ombros como quem não quer nada, câmeras (como a minha) registravam um mar de cabeças antes de qualquer coisa. (Porque não calcei meus andaimes?)
Cada grupo que desfilava possuía sua própria música e com sorte, a sua própria banda. Um deles trazia um polvo que reclamava para si os impostos, em um jeito de brincar tipicamente francês. Os dois grupos de brasileiros que passaram, levantavam expectativas, mas a verdade é que não tiveram muito sucesso. Quando ouvi a bateria do segundo se distanciar, senti uma melancolia, uma espécie de acerto de contas com o passado. Aos dois anos, depois de uma disparada homérica e de ser alcançada pela corrida desesperada da minha mãe, voltei para os braços do meu padrinho e perguntei chorando: "dindo, tu pompa um panaval pá mim?" Com mulatas, com bateria, com brilho, com tudo tudo? E sem perceber ele passou por mim e desta vez eu não corri. Fiquei estacada com a maioria da multidão a balançar o ombrinho. Mais alguns foliões passaram vindos da vizinha Alemanha, de Baden-Baden, mais uma corja de bruxas e palhaços estilo Rod Stewart. Ao dobrar da esquina se avistava o último grupo sendo seguido de perto pelas ambulâncias. E no prenúncio de que o melhor fica para o fim, observei com ansiedade os dançarinos vestidos de dourado, preto e vermelho que se aproximavam em uma dança com pinceladas de candomblé. O som ao viajar pelo vento, acertou em cheio o peito: as batidas do surdo e do meu coração sincronizaram-se. E aquela máxima que diz que quem não gosta de samba ou é doente da cabeça ou doente do pé, mostrou-me que os franceses não desgostam nada do samba, tem é qualquer probleminha ali mesmo, nos pés. Nesta hora eu já não quis saber de mais nada, sambei, sambei e sambei com sede, uma sede que só quem está longe sabe. As pessoas passavam, olhavam e se cutucavam, e eu continuei. Fui seguindo o carnaval até a multidão ir se despedindo, os grupos se dispersando, os foliões se desfazendo de suas fantasias. Enquanto houve música sustentei a ilusão de que aquele era o carnaval prometido que muitos anos depois tinha enfim me encontrado. Quem diria que  havíamos de nos esbarrar aqui neste fim de mundo? E desta vez eu ri, corri e ninguém veio me segurar!... Pena mesmo foi não poder levar para casa o carnaval que ganhei...

sexta-feira, 7 de março de 2014

Amor é novela, sexo é cinema

" Sexo é imaginação, fantasia

amor é prosa,

sexo é poesia"




Estes dias estava pensando porque sexo é super bom nos filmes? A mocinha sempre fecha os olhinhos como se algo muito mágico fosse acontecer, o mocinho nuncaaaa tem bafo, a mocinha não precisa tentar se estimular porque sempre há um orgasmo vaginal (luck girl!). O mocinho não fica horas tentando achar o ponto G, nem põe a camisinha se é sexo casual, pra quê quebrar o clima, né minha gente? 
Aí eu penso o que que eu to fazendo de errado? Não ouvi sinos, não sei uma posição do kama sutra, nunca experimentei velas e incensos já que não tenho fetiche por templo budista...
 E enquanto via a Liv Tyler e o Charlie Hunnam transar na beira de uma mesa pensei, "ah e tu no feijão com arroz". E outra voz completa desdenhosa: também, eles não tem pirralhos para ficar chamando que querem água, que querem saltar para o meio da cama, que querem enfim, foder a paciência. E tu ainda tens que te concentrar no orgasmo, na fantasia, onde tu estavas? Aí te distrais porque ele não te toca como devia ser, porque ele também já tem sono, quem manda ser a esta hora da noite? E aí já ficas de saco cheio e já tens pressa que acabe, já tens impaciência com o teu próprio prazer. E acabas por pensar neste meio tempo na injustiça que é depender de um botãozinho delicado e de carradas de imaginação para chegar lá enquanto para eles bastam uns para frente e para trás e já está. Aí chegas a conclusão de que o sexo no cinema deve ser a extensão daqueles filmes disney em que as princesas só dão um selinho no final.
 Volto para a Liv que, com seus olhos profundamente azuis mastiga minha inveja todinha, caramba vai ser linda assim na China... Enquanto a simultaneidade do orgasmo entre os dois acontece, o que o torna ainda mais etéreo e irreal. Pelo menos não foram felizes para sempre, que aí já era demais!

"Sexo vem dos outros,                        

E vai embora

Amor vem de nós,

E demora"




quinta-feira, 6 de março de 2014

O dinheiro não aceita desaforo

Selfie de hoje, querido primo diz: pronto para a balada! hahahah


O marido sentenciou: nem que eu fosse rico criava um filho assim! Isto porque eu havia lhe contado minutos antes sobre a mais nova aquisição do meu primo. Um tênis Nike de 700 reais. Ele tinha em seus pés exatamente o valor que uma pessoa leva um mês para receber. Sabe, eu não tenho inveja, juro que não tenho. Eu tenho é tristeza, é pena, é revolta, tudo misturado em uma bola só. Não é um tênis para um atleta nem que seja amador, não, é um tênis para desfilar no shopping. Não é simplesmente um tênis caríssimo comprado com o suor de seu trabalho ou mesmo por merecimento por ser um bom filho ou estudante (que não é). É um tênis símbolo de ostentação, mais um para a coleção como ele mesmo disse, terminando como termina todas as suas publicações: com um risinho histérico, nervoso. Desde que fez 18 anos, trocou três vezes de carro e sempre fez questão de mostrar com fotos e detalhes as modificações, a aparelhagem soberba de som, as rodas personalizadas. A coleção de garrafas Absolut guardadas no armário, o engradado de cerveja antes de cada festa. Quem vê o estilo de vida pensa que ela vai muito bem, e vai...à base de empréstimo e dívidas. 
O marido trabalhou 18 anos em uma bem sucedida empresa familiar antes de ir para Portugal, e apesar de riquíssimos, os donos da mesma faziam questão de que se algum dos filhos ou sobrinhos quisessem trabalhar nela, tinham de começar por baixo. Assim era ver os futuros diretores a fazer serviços de "boy" como tirar cópias, fazer recados, e todo o tipo de tarefas humildes que cabiam aos empregados.  Tal medida, além de ser uma forma de conhecer o funcionamento da empresa, servia principalmente para ensinar a dar valor ao dinheiro. Mostrar o quanto custa trabalhar um mês inteiro para ganhar um salário muitas vezes baixo dependendo do que se fizesse. 
A impressão que me dá é que os meus tios leram aquelas listinhas de como criar um filho tirano e as aplicaram sem se dar conta de que deviam ter feito o oposto. E esta má interpretação ou falta de sensibilidade para a ironia, transformou o meu agora não tão pequeno primo em um rei déspota, infantilizado e que leva muito a sério a sua torpe de bobos que lhe fazem a alegria da corte. Eu não sei, o marido aposta que vai acabar mesmo é substituindo o pai no sindicato, assim como este substituiu o meu avô. Mas isto só se for quando a mesada esgotar ou o banco cortar os empréstimos...

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