domingo, 13 de abril de 2014

Just turn around now, cause you're not welcome anymore

Eu tinha uma amiga que começava a caminhar em sua velha esteira mecânica ao som de Gloria Gaynor, I will survive. Costumava rir dela, pois para mim naquela época exercício físico era quase um vício e não achava aquilo minimamente estressante, muito menos um caso de vida ou morte. Mas como sempre, a vida tem um certo dom para fazer-nos engolir nossas verdades uma a uma, e hoje a fatídica música faz parte do meu repertório no ipod. Bem sei que a letra fala sobre uma mulher indignada perante a volta do outrora amante, e dá cá uma raiva deste sujeito mesmo sem conhecê-lo! Ah, a raiva também é um excelente combustível para enfrentar o treino de cárdio tanto quanto a depressão o é para a escrita. Estando eu lá em movimentos frenéticos, ou correndo ou pedalando, trato de por um rosto neste meu ódio quiçá gratuito. Tenho imensa raiva de ter engordado de novo, de ter novamente me abandonado e ter travado uma disputa sobre quem engolia mais: eu ou o medo. O problema é que nesta luta ele sempre ganha, mas quem fica com os quilos sou eu. Não há como voltar a balança para trás, só me resta pegar humildemente a toalhinha e fazer aquele trabalho de formiga, tomando cuidado para não olhar muito para o espelho. O cara da música da Glória pode ter sido o maior cafajeste, enchendo-a de bombons e falinha mansa, deixando-a na fossa depois, mas que ele tá muito parecido com vilão da minha história, isto tá!

Para matar a saudade:

sexta-feira, 11 de abril de 2014

O mico nosso de cada dia

Pensa em uma pessoa cansada. Não, tipo bem cansada, com as pernas latejando depois de um treino de uma hora e meia. Cheguei trazendo shampoo, creme e gel de banho. Ufa! A água quente nas costas mesmo que por 17 segundos (me dei ao trabalho de contar) retirando o suor do corpo. Fechei os olhos por pouquíssimo tempo e de repente ouço tocar o alarme do prédio. Insistente e monótono como o bonjour do motorista do ônibus. Ai meu Deus, o que que eu faço? Saio correndo enrolada na toalha porta a fora? E se for um teste? A espuma escorria dos meus cabelos. E se neste momento tá rolando o maior fogaréu no saguão? Olhei para o canto do vestiário que conseguia avistar: nem viva alminha. E agora José? Com o creme, o shampoo e o gel na mão pronta para correr (e provavelmente levar um tombo) escuto a voz vinda das caixas de som. Mesdames e messieurs o que? Só podem estar brincando comigo, tenho a impressão que o sujeito colocou uma batata na boca de propósito antes de falar! Isto é uma emergência ou n'est pas uma emergência? Ele disse "permaneçam calmos" ou "boa sorte e que let the game begin"? Do mesmo jeito que a voz apareceu, sumiu do nada, sem explicação nenhuma. E o alarme continuava. Imaginei logicamente que se houvesse real urgência de evacuar a academia, alguma criatura havia de checar se alguém tinha ficado para trás...tomando banho...pensando se devia correr ou passar o segundo creme nas pernas.
Foi um alívio entrar no vestiário e ver ele como de hábito, com gente se preparando para sua sessão básica de tortura. Vesti-me e saí. O alarme ainda estava tocando. Nunca vou esquecer como se sentem aquelas vovós que não entendem/escutam o que a gente fala. Nota mental: na dúvida, haja naturalmente (ainda bem que não saí correndo com a toalha)!

quinta-feira, 10 de abril de 2014

E o francês?

O Fabian tem uma fixação por um dos colegas da escola. A primeira coisa que diz quando me vê é: posso corrê com o Alpharren? Se chego um nano segundo atrasada e dá o azar do menino sair antes dele é uma choradeira. Várias vezes lhe aviso que não nasceram grudados, não é porque um faz que o outro tem que fazer, mas não adianta. Saem correndo e rindo em uma simbiose de clones, pulando a cerca do jardim, apertando nas campainhas e deixando o zelador do prédio alto tão cinzento como ele, a bradar. Durante a tarde só quer saber se o amigo vai dormir na escola também e lá tenho de ouvir a cada minuto se eu tinha mesmo mesmo mesmo a certeza de que o Alpharren ia. Hoje esteve duas horas a brincar com ele até o pai chegar do trabalho e atravessar a praça. Engraçado foi ver sair da boca do pequeno turco "vamu corrê", assim como Hafize sorria quando o Fabian soltava umas frases em sua língua. Mas e o francês? Vai indo, obrigada. Mas tenho aqui a impressão de  que ele ainda aprende turco primeiro.

Ainda bem


Não, não é o sorvete de arroz doce da ali na Rua da Prata, mas é o de morango na Rue de Austerlitz que desce pastoso e fofo como se quer o bom gelato. Não é o rio Guaíba, tampouco o Tejo, mas é o Ill serpenteando pelos contornos da cidade tal como um amante acaricia o corpo de sua amada. Dentro das pequenas janelas de madeira a cidade espia os habitantes, escuta a conversa jogada nos bancos, fotografa em câmera lenta os ciclistas e seus mil e um code dress que vão desde o praiano ao sport chic com salto agulha. 
Ainda bem que existe outro dia, outros sabores e outra vida a esperar por nós ao virar da esquina. Ainda bem que podemos virar a página e suspirar de alívio que o que temos agora compensa o que deixamos para trás. 

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