terça-feira, 15 de abril de 2014

Terceira idade

O maior sonho do marido é se aposentar. E fazer o que, pergunto? Ora, nada. Fazer nada é muito tranquilizador para quem trabalhou trinta anos com os olhos em uma tela de computador (e ainda tem mais pela frente). Ele estica os braços e massageia os dedos com tendinite crônica. Suspira: porque bem que o Euromilhões podia ter saído esta semana ao invés de ter se limitado a ficar um número antes ou um número depois dos que ele jogou. 
Ontem à tarde tocaram a campainha e quando abri a porta dois idosos gorduchitos estavam me olhando. Entregaram-me um convite e falaram e falaram e eu não entendi metade, mas agradeci na mesma. Quando eles foram embora, abri o convite que até então imaginei que se tratava de uma festa da Mairie (prefeitura), mas era de um culto lá para os lados de Hoenheim. Não importa no que se metam, mas os velhinhos daqui gostam mesmo é de estarem ativos. É muito comum se engajarem em campanhas políticas e saírem  a distribuir panfletos. Mês passado, estavam na escola do Fabian fazendo uma pesquisa sobre como os pais gostariam que fossem administradas as atividades físicas e pedagógicas dos filhos. Com base nas respostas os candidatos iriam elaborar a campanha eleitoral.
Os professores do meu curso de francês são todos aposentados voluntários e que na maioria das vezes envolvem-se em outros cursos para estrangeiros, como informática  e o ensino do alfabeto francês voltado para os árabes e chineses principalmente. A minha antiga professora, ainda completa sua agenda fazendo teatro e diz sem pestanejar que detesta estar parada. 
Os vizinhos da casa ao lado, os quais consigo "espiar" pela janela da cozinha, também são outro exemplo de que eu pareço muito mais terceira idade do que os seus cabelos branquinhos. Sempre arrumados, com andar jovial, levantam-se cedo e não param em casa. Seguido os vejo a passear nas ruas nem que seja para esticar as pernas. Ah e também vão à feira a pé, e voltam carregados de caixas de madeira e sacolas ecológicas. Fora que ver gente que beira os 90 anos, talvez até mais,  magros a pedalar na sua bicicleta, é um soco no estômago do meu sedentarismo convicto. Se aposentar aqui, significa apenas deixar de trabalhar, não é de maneira nenhuma sinônimo de pantufas, perna pro ar e programas de auditório. 

Silvio Santos é que não ia achar muita graça.

Beijinho no ombro

É viral. De uma hora para outra a timeline encheu-se de fotos com pessoas beijando o ombro para espantar o recalque. Aí eu pergunto: de quem? Acho quase patológico esta necessidade de sentir-se invejado, sim, porque a inveja é uma coisa que ao mesmo tempo que é rechaçada é um objetivo de vida, pois ninguém inveja gente fracassada. Vou largar meu politicamente correto lá no canto, tá bem? Pronto. 
Todo mundo tem inveja. Em algum momento, por alguma coisa, é inevitável, é humano e por si mesmo, compreensível. Eu tenho inveja, morro, morro, morro de inveja de quem com dois meses de pós gravidez tem uma barriga lisinha, sem aquela gelatina que se transformou a minha. Tenho inveja de quem vai pro Caribe. Caramba, é meu sonho, aquelas cabanas à beira-mar, mergulhar de snorkel, entrar no jacuzzi e ficar olhando o por-do-sol. Sempre que vejo uma foto de alguém se casando, a noiva de branco, o noivo com um sorriso de uma orelha a outra, eu tenho inveja. Gente, não existe inveja branca, a menos que se faça um degradê de azia que vai do desde "queria levemente ter/ser isto" a o "desgraçado/a quero que você morra!" Não acredito nisto, inveja, é inveja. Inveja não tem cor. 
O problema está em ultimamente termos vivido em uma cultura da ostentação. Aí o cara coloca uma piscina de plástico no quintal e acha que está ostentando. Quem vai para a praia, mesmo que seja no nosso mar chocolatão do sul, manda beijinho no ombro para quem fica torrando na cidade, quem tem um Galaxy ou um Iphone, manda recado para quem tem um nokia fudido. A sério que entendo esta revanche, que nada mais é do que gente que está ascendendo socialmente porque gente rica mesmo não precisa se auto afirmar a todo tempo. Isto vai cair na mesma polêmica do rei do camarote: na verdade todos nós ostentamos do ponto de vista de quem tem menos que nós. Mas não pensamos nestes e sim em acusar aquele que tem a mais de ostentação e de nos criar este sentimento tão amargo que é a inveja.  Portanto, cada vez que vejo alguém mandando beijinho no ombro acho uma puta de uma hipocrisia, pois parte do objetivo não é espantá-lo e sim despertar o recalque nos outros. Embora tenha casos que só me façam rir (como o da piscininha de 1000 litros), imagino que seja para quem o faz uma fonte de auto-estima e sucesso. Ser invejado é estar  na moda.

Fabionices

Olhando pela janela:
- Pai, não dá pra sair, tá muito fio! O vento tá misturando a árve!

            *           *          *

- Fabian bota logo estes tênis!! - Já perdendo a paciência.
- Tá, mãe ti acalmeja. Já buti.


Oi?

domingo, 13 de abril de 2014

Just turn around now, cause you're not welcome anymore

Eu tinha uma amiga que começava a caminhar em sua velha esteira mecânica ao som de Gloria Gaynor, I will survive. Costumava rir dela, pois para mim naquela época exercício físico era quase um vício e não achava aquilo minimamente estressante, muito menos um caso de vida ou morte. Mas como sempre, a vida tem um certo dom para fazer-nos engolir nossas verdades uma a uma, e hoje a fatídica música faz parte do meu repertório no ipod. Bem sei que a letra fala sobre uma mulher indignada perante a volta do outrora amante, e dá cá uma raiva deste sujeito mesmo sem conhecê-lo! Ah, a raiva também é um excelente combustível para enfrentar o treino de cárdio tanto quanto a depressão o é para a escrita. Estando eu lá em movimentos frenéticos, ou correndo ou pedalando, trato de por um rosto neste meu ódio quiçá gratuito. Tenho imensa raiva de ter engordado de novo, de ter novamente me abandonado e ter travado uma disputa sobre quem engolia mais: eu ou o medo. O problema é que nesta luta ele sempre ganha, mas quem fica com os quilos sou eu. Não há como voltar a balança para trás, só me resta pegar humildemente a toalhinha e fazer aquele trabalho de formiga, tomando cuidado para não olhar muito para o espelho. O cara da música da Glória pode ter sido o maior cafajeste, enchendo-a de bombons e falinha mansa, deixando-a na fossa depois, mas que ele tá muito parecido com vilão da minha história, isto tá!

Para matar a saudade:

Web Statistics