sexta-feira, 18 de abril de 2014

Crianças francesas não fazem manha*

Mas também não fazem mais nada. Juro, demorei todo este tempo para falar sobre isto porque estava digerindo e observando melhor antes de me pronunciar sobre o assunto. Meu filho é a única criança que vem para casa com os joelhos sujos. Só em um mês ele conseguiu furar três calças de moletom e uma jeans (!!), a qual tive de atempadamente colar o "Homem Anhanha" antes que ela se desfizesse. Também é o único que pelos vistos não sabe usar o "pananapo" e eu só fico sabendo o que comeu de lanche pela cor das mangas: se estão cor-de-rosa, iogurte de morango, se estão marrons, chocolate de caixinha. Quando levava ele para o turno da tarde, depois do almoço, notava a roupa imaculada das outras crianças e de alguns memorizei para saber que não haviam-na trocado. 
Por outro lado, é verdade que para se ver uma criança fazendo birra tem de se estar muito atento e eu neste tempo todo que moro aqui, só vi uma vez e ainda assim foi tão fraquinha que quase nem notei. Quando meu filho chora na rua (e isto acontece frequentemente) parece uma coisa surreal: pessoas param para olhar, viram o pescoço e eu me sinto a pior criminosa apenas por tentar educá-lo dizendo que não pode fazer tudo que quer. 
Uma coisa que me chamou bastante atenção logo que cheguei, foi a quantidade de crianças pequenas com três anos, talvez quatro, a andarem de bicicleta sem rodinhas (e eu fiquei pensando que a primeira vez que consegui este feito era uma barbada de oito anos). Mas não é só: elas andam so-zi-nhas e muitas vezes na rua, já que a ciclovia separada fisicamente dos carros não existe em todos os lugares. Os adultos vão na frente e não ficam cuidando a cada cinco segundos se elas ainda os acompanham, eles simplesmente confiam que elas o estão fazendo. 
Faz sentido que o sistema de se débrouiller (se desenrascar) seja aplicado cada vez mais no país da comunidade européia com maior índice de natalidade. Uma mãe aqui tem uma média de três filhos com pouquíssima diferença de idade, assim, espera-se que os mais velhos consigam gerir suas necessidades sem grande intervenção dos adultos. Se por este prisma parece um alívio a quem está acostumado com uma criança que exige atenção em todo o tempo que está acordada, por outro a impressão que dá, é que tanta auto-suficiência cria pequenos robôs. Por serem coibidos de expressar sentimentos como raiva, revolta, ou até alegria efusiva, as crianças francesas tem um olhar inexpressivo. Parecem estar sempre temendo um olhar reprovador justamente por serem...crianças. 
É muito interessante problematizar a educação que damos para os nossos ao comparar com outras culturas. Há algumas coisas que gosto, como por exemplo, eles deixarem os seus filhos "respirar", terem suas experiências e claro, por vezes caírem e se machucarem. Porém ainda continuo achando que o melhor seria um meio termo entre nós: nem tanto "te vira" e nem tanto "deixa que eu faço". Mas por via das dúvidas vou já preparar as joelheiras, que auto-colantes de desenhos animados estão pela hora da morte.


*Livro da autora Pamela Druckerman

terça-feira, 15 de abril de 2014

Terceira idade

O maior sonho do marido é se aposentar. E fazer o que, pergunto? Ora, nada. Fazer nada é muito tranquilizador para quem trabalhou trinta anos com os olhos em uma tela de computador (e ainda tem mais pela frente). Ele estica os braços e massageia os dedos com tendinite crônica. Suspira: porque bem que o Euromilhões podia ter saído esta semana ao invés de ter se limitado a ficar um número antes ou um número depois dos que ele jogou. 
Ontem à tarde tocaram a campainha e quando abri a porta dois idosos gorduchitos estavam me olhando. Entregaram-me um convite e falaram e falaram e eu não entendi metade, mas agradeci na mesma. Quando eles foram embora, abri o convite que até então imaginei que se tratava de uma festa da Mairie (prefeitura), mas era de um culto lá para os lados de Hoenheim. Não importa no que se metam, mas os velhinhos daqui gostam mesmo é de estarem ativos. É muito comum se engajarem em campanhas políticas e saírem  a distribuir panfletos. Mês passado, estavam na escola do Fabian fazendo uma pesquisa sobre como os pais gostariam que fossem administradas as atividades físicas e pedagógicas dos filhos. Com base nas respostas os candidatos iriam elaborar a campanha eleitoral.
Os professores do meu curso de francês são todos aposentados voluntários e que na maioria das vezes envolvem-se em outros cursos para estrangeiros, como informática  e o ensino do alfabeto francês voltado para os árabes e chineses principalmente. A minha antiga professora, ainda completa sua agenda fazendo teatro e diz sem pestanejar que detesta estar parada. 
Os vizinhos da casa ao lado, os quais consigo "espiar" pela janela da cozinha, também são outro exemplo de que eu pareço muito mais terceira idade do que os seus cabelos branquinhos. Sempre arrumados, com andar jovial, levantam-se cedo e não param em casa. Seguido os vejo a passear nas ruas nem que seja para esticar as pernas. Ah e também vão à feira a pé, e voltam carregados de caixas de madeira e sacolas ecológicas. Fora que ver gente que beira os 90 anos, talvez até mais,  magros a pedalar na sua bicicleta, é um soco no estômago do meu sedentarismo convicto. Se aposentar aqui, significa apenas deixar de trabalhar, não é de maneira nenhuma sinônimo de pantufas, perna pro ar e programas de auditório. 

Silvio Santos é que não ia achar muita graça.

Beijinho no ombro

É viral. De uma hora para outra a timeline encheu-se de fotos com pessoas beijando o ombro para espantar o recalque. Aí eu pergunto: de quem? Acho quase patológico esta necessidade de sentir-se invejado, sim, porque a inveja é uma coisa que ao mesmo tempo que é rechaçada é um objetivo de vida, pois ninguém inveja gente fracassada. Vou largar meu politicamente correto lá no canto, tá bem? Pronto. 
Todo mundo tem inveja. Em algum momento, por alguma coisa, é inevitável, é humano e por si mesmo, compreensível. Eu tenho inveja, morro, morro, morro de inveja de quem com dois meses de pós gravidez tem uma barriga lisinha, sem aquela gelatina que se transformou a minha. Tenho inveja de quem vai pro Caribe. Caramba, é meu sonho, aquelas cabanas à beira-mar, mergulhar de snorkel, entrar no jacuzzi e ficar olhando o por-do-sol. Sempre que vejo uma foto de alguém se casando, a noiva de branco, o noivo com um sorriso de uma orelha a outra, eu tenho inveja. Gente, não existe inveja branca, a menos que se faça um degradê de azia que vai do desde "queria levemente ter/ser isto" a o "desgraçado/a quero que você morra!" Não acredito nisto, inveja, é inveja. Inveja não tem cor. 
O problema está em ultimamente termos vivido em uma cultura da ostentação. Aí o cara coloca uma piscina de plástico no quintal e acha que está ostentando. Quem vai para a praia, mesmo que seja no nosso mar chocolatão do sul, manda beijinho no ombro para quem fica torrando na cidade, quem tem um Galaxy ou um Iphone, manda recado para quem tem um nokia fudido. A sério que entendo esta revanche, que nada mais é do que gente que está ascendendo socialmente porque gente rica mesmo não precisa se auto afirmar a todo tempo. Isto vai cair na mesma polêmica do rei do camarote: na verdade todos nós ostentamos do ponto de vista de quem tem menos que nós. Mas não pensamos nestes e sim em acusar aquele que tem a mais de ostentação e de nos criar este sentimento tão amargo que é a inveja.  Portanto, cada vez que vejo alguém mandando beijinho no ombro acho uma puta de uma hipocrisia, pois parte do objetivo não é espantá-lo e sim despertar o recalque nos outros. Embora tenha casos que só me façam rir (como o da piscininha de 1000 litros), imagino que seja para quem o faz uma fonte de auto-estima e sucesso. Ser invejado é estar  na moda.

Fabionices

Olhando pela janela:
- Pai, não dá pra sair, tá muito fio! O vento tá misturando a árve!

            *           *          *

- Fabian bota logo estes tênis!! - Já perdendo a paciência.
- Tá, mãe ti acalmeja. Já buti.


Oi?

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