segunda-feira, 5 de maio de 2014

Santa hipocrisia, Batman!

A primeira vez que li isto me deu uma vontade louca de rir. De nervoso, claro. A filha da Monique Evans (eterna musa dos anos 80), a Bárbara Evans, que faz o tipo modelo-loira-sem-sal, postou uma foto maaaagra de morrer com o dizer "que todas as meninas tem que se aceitar como são". O detalhe é que no mesmo dia saiu uma reportagem no site da Globo onde ela contava sobre uma dieta que a tinha feito perder 9 quilos em um mês. Isto mesmo: 9 quilos. A filha do Ozzy Osbourne, a Kelly, que eu acompanhava no início dos anos 2000 com seu estilo patricinha do punk, bermudas pretas e cabelo rosa, cantando Madonna: papa don't preach,(...) I'm gonna keep my baby. Esta mesmo. Que vivia ridicularizando as moças oxigenadas e magras, as Barbies americanas devidamente padronizadas do mundo pop e arredores, eis que muda de cidade, de amizades e de estilo, terminando por  ser justamente...uma moça oxigenada e magra (dentro das possibilidades de seu corpo). 
Eu acho lindo esta bandeira de aceitação que algumas defendem. Só acho difícil de acreditar. Porque o que a mídia e todos os seus representantes famosos (sejam eles ao mesmo tempo passivos e ativos no quesito padrão de beleza) fazem, é nos empurrar um conceito restrito do que é belo. E depois de encher a cara da Julia Roberts com photoshop, encher todos os buraquinhos de celulite da Juliana Paes na praia ou encher-se de sucos detox, nos passam a mão na cabeça. Veja bem, não faz mal que você não seja perfeita, não faz mal que você se entupa de creme adelgaçante e entre em desespero porque não há o seu número naquela calça jeans maravilhosa. Mas continue tentando! É isto que o sistema faz. Nos enlouquece, nos coloca um patamar impossível de satisfação e nos devolve um falso estandarte de aceitação, tão falso quanto o último discurso da Beyoncé. Que não estava magra o bastante e resolveu fazer mais uma dieta mirabolante da vez, mas ó, isto sou eu viu, gente? Vocês, ah vocês tem que se aceitar. E diz isto como se ela não tivesse responsabilidade nenhuma em quebrar este pensamento, como se ao submeter-se ao perder mais peso não influísse no resto. Não, eu não sou contra o emagrecimento para sentir-se bem, mas até que ponto é sentir-me bem comigo e até que ponto é querer alcançar um status de plena aceitação social? Se a Beyoncé acha que ela tem de se submeter a constantes dietas detox para aprovação do público, que louco seria se deixasse ficar suas curvas onde estão e que o público por sua vez não exigisse nem de si nem dos famosos tamanha perfeição. É como eu digo, é uma via de mão dupla, que é extremamente cruel com quem tenta cruzá-la na contramão, mas a estes, meu sincero obrigada. Enquanto isto, vamos ver as pseudo-libertárias da opressão da beleza fazerem discursos ocos até um dia em que vencerem a queda de braço com a balança.
Ah sim, esqueci de dizer que a imagem que ela postou do alto de sua aceitação à base de proteínas e drenagem linfática e carboxiterápica, foi esta.

Kelly em um momento antes e depois.


sexta-feira, 2 de maio de 2014

Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência

Não vou lembrar, não adianta...mas isto é só um mero detalhe. O nome. Quando eu era pequena, tinha um livro que falava sobre a amizade da Dona Geladeira e da Dona Gilete. Amigas bem improváveis, eu sei. Acontece que a D. Geladeira era sempre muito gozada pelos colegas pelo simples fato de ser gorda. Lembro-me tão bem das ilustrações, das pernas redondas da geladeira amarela, assim como dos traços finos que eram os membros da sua amiga Gilete. Cada vez que as pessoas riam, mais gorda a D. Geladeira ficava, e mais comida ela guardava. No final, já enorme e quase sem conseguir andar, ela esconde-se em casa, decidindo não ir mais à escola. A amiga vai lhe visitar, mas quase morre com a explosão assim que abre a porta. Morreu? Lá estava ela bem murcha em um canto, com toda a comida espalhada nas paredes e no chão. Desta vez, magra e apoiada pela sua fiel companheira, ela volta para a escola e ninguém mais ri dela. Pergunto-me o que aconteceu depois...engordou como em um ciclo de compulsão-passivo-agressiva? Todo mundo a respeitou  apenas porque estava finalmente magra? Não sei...e que inquietante é não saber o final da nossa história...

segunda-feira, 28 de abril de 2014

A vaga da discórdia

Adoro a lógica dos meus vizinhos, sério. Moramos em um terreno que possui duas casas grandes divididas e transformadas em apartamentos. Cada apartamento tem direito a uma vaga para carros e é de conhecimento geral que não temos (ainda) nenhum, visto que a vaga costumava estar vazia. Disse costumava porque ultimamente o vizinho de cima tem estacionado dois carros aqui. Eu procuro ser justa, mas isto está me incomodando, porque um dia recebemos visitas e a pessoa colocou na vaga dele sem querer. Ao invés dele colocar na nossa, fez questão de por na do lado e esperar em pé, na chuva e no frio até que as pessoas desocupassem a sua vaga. E depois com a maior cara de pau usa a seu bel prazer, há um mês o nosso lugar sem ao menos um pedido de permissão. Assim que a nossa voiture pousar aqui em casa, vai levar com uma plaquinha bem bonita para deixar de ser bicão. To só no aguardo...esperando...com um sorriso bem educado como manda a má educação francesa. 

"Ce poste est lié à l'appartement du rez-de-chaussée. S'il vous plaît ne pas l'utiliser."

domingo, 27 de abril de 2014

Telhado de vidro



Inscrevi-me em um grupo de discussão de jovens feministas há um mês e neste pequeno período já consegui enxergar muitas coisas que nunca tinha dado importância. Mais ou menos como achar que tudo esteve sempre lá e não há razão nenhuma para que a a ordem seja esta e não outra. Mas o que tenho notado agora, nem é tanto a questão do movimento feminista por si mesmo, mas a forma como as pessoas se relacionam, ainda que virtualmente. A quantidade de mal entendidos que afloram pelo simples fato de não estarmos atentos a outros sinais que estão a nossa disposição em uma conversa física: o olhar fugidio, o tom da voz, a risada ou a voz tremida. Uma coisa que é dita de forma neutra pode ser interpretada como um pavio aceso, pois que a pessoa sente-se atingida, ofendida e sei mais o que. À parte questões óbvias a nível de desconstrução de um discurso racista, classista, machista a que fomos habituados desde a infância, noto que também há uma certa apropriação do que escrevemos para questões pessoais mal resolvidas.
E digo isto porque hoje ao falar com uma amiga no Brasil sobre o post do meu blog que ela também está acompanhando, tenho me deparado com respostas e agressões que estão além do que acho um nível normal de indignação.  E ela disse que para começar, eu deveria ficar feliz, que o meu objetivo está a ser alcançado. A gente incomoda quando pensa diferente. Eu por alguma razão, incomodo estas mulheres. Porque hein? 
O interessante é que dá para ver direitinho quem discorda sem levar para o lado pessoal e quem sente-se ferido e irritado porque eu tenho o direito de pensar de outra forma. 
Aproveitei a ideia para pensar no quanto eu fiquei incomodada com este grupo no início. Como ele atingiu meus preconceitos, meus medos, meu racismo. Sentei e observei. Critiquei (aqui comigo) e li e li e li. E procurei ter  empatia com o crossdresser que colocou suas fotos vestido de mulher, procurei ver o sofrimento da jovem negra que ainda hoje tem raiva de gente branca, procurei ver a pouca flexibilidade minha e alheia para com a dor dos outros. E é difícil para caramba. Porque depois de um tempo a gente se acostuma com o que é e com o que pensa, mas é aí que já tá na hora de mudar de novo, de abrir mais um pouco a cabecinha e deixar entrar coisas novas. Sempre digo que o ser humano é um ser de hábitos e que tende a se acomodar, que não gosta de experimentar insegurança mesmo no campo das ideias. E se olharmos bem para a história veremos que demos saltos graças à coragem de alguns, pois que a massa sempre vai é arrastada como na música do Lulu "com passos de formiga e sem vontade" .
E é isto: incomodar gera reflexão. Isto é, se a pessoa permitir, se ela analisar a sua própria reação de raiva, de medo, etc e tentar descobrir porque vem à tona estes sentimentos. Quando algo nos incomoda é um sinal de alerta para o pó que deixamos assentar na nossa casa interior. E não podemos nos esquecer que toda casa tem teto de vidro, justamente para podermos  reconhecer nossa fragilidade na fragilidade dos outros.

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