quarta-feira, 4 de junho de 2014

Porque não gosto do politicamente correto

Imagina a dor, mas imagina o alívio de dizer o que se pensa.


Porque não adianta nada. É só uma maquiagem para acalentar todo o preconceito para baixo do tapete, e quem diz ou vive o politicamente correto sem revê-los aos menos de vez em sempre é quase tão culpado quanto os que deixam os seus bichos à solta.
Certo dia vi um programa americano sobre perturbações neurológicas e nele contaram a vida de um homem que sofria de Coprolalia. Esta doença nada mais é do que todos os nossos pensamentos mais escrotos que procuramos esconder, virem à luz do dia e...não é bonito. A equipe de filmagem acompanhou uma ida ao mercado com o pobre  a xingar Deus e o mundo, a escapar de bolsadas, olhares fulminantes e socos entre os corredores. Olhava para um homem musculoso de camisa colada e gritava "viado", olhava para uma senhora e dizia "gorda do caralho". Depois em casa, ele chorava e lamentava o que não conseguia controlar...nesta hora pensei justamente naqueles que são completamente contra a falsidade e fazem questão de inundar o facebook com mensagens do tipo. A verdade é que somos todos preconceituosos e que muitas vezes o mundo só resiste graças a uma grande dose desta. Se sairmos por aí dizendo tudo que se passa na cabecinha, seria bom checar se o seguro  de saúde (ou de vida) cobre acidentes por franqueza extrema.
É um fato que o humor brasileiro é firmemente baseado no nosso preconceito. Não adianta colocar a culpa na sociedade e não se tocar que fazemos parte dela. É ver os humoristas a gozarem com o negro, com o gordo, com o gay, com as minorias enfim. E achamos graça na maior parte das vezes tão somente porque esta linguagem politicamente incorreta dialoga com os nossos preconceitos mais arraigados. E se a nossa sociedade é racista, xenófoba, gordofóbica, nós também o somos. A notícia boa é que ao tomar consciência disto  podemo-lo desconstruir, mas não é trocando negro por afrodescendente ou bicha por homossexual  que muda alguma coisa se o que pensamos (mas não dizemos) continua intocável.
Eu sinceramente queria ver se todos os neuróticos pró-sinceridade iriam aguentar ouvir o que os outros pensam de si o tempo todo. Para já ia ser uma ótima experiência sociológica se a rede de relacionamentos mais famosa do mundo propusesse um dia da verdade. Um dia em que falássemos tudo o que pensamos sobre as postagens, sobre as fotos alheias. É claro que não rola...era capaz mesmo de se iniciar uma terceira guerra mundial pelo egocentrismo ferido. De qualquer forma, o que vale mesmo é o que faremos depois disto, se ajustaremos continuamente esta tal balança regulatória entre o que deve ou não ser revelado, sempre tendo em mente que é impossível nos fazermos de vítima da falsidade.

Dê férias para os seus pés (ao menos para eles)

Voltei as minhas Havaianas, pois os chinelos daqui são uma tristeza, duros como o raio e alguns ainda tem o desplante de custarem até mais que as legítimas. Adorooo o detalhe dos brigadeiros (negrinhos)!

terça-feira, 3 de junho de 2014

Coisa de criança

Quando eu cheguei aqui ainda tinha a sensação de que ia realizar um desejo de infância. Tenho uma costela alemã e até acho que puxei uns (muitos) genes Schuch, já que o meu bisavô era temivelmente conhecido como  tendo um gênio difícil. Pois o meu sonho era comer um dia chucrute. Sempre que falavam das festas alemãs no interior do Rio Grande do Sul,  imaginava um monte de gente feliz, bêbada e que alternava entre uma cerveja e outra, umas colheradas de chucrute. E o que seria o tal chucrute? Só pelo nome podia ser delicioso,  uma seleção de batatas gratinadas com linguiça e creme se infiltrando por todo o prato talvez.. Um dia falei ao marido sobre o meu desejo e ele riu muito. Tu queres, eu te levo para comer chucrute, ele disse. Mas depois ficou com pena e entregou-me: tu sabes o que é isto? É "só"  tudo aquilo que tu detestas...repolho fermentado com vinagre. Aquilo soou-me tão nojento que não pude deixar de lembrar-me do cheiro do vinagre, da minha mãe empesteando os meus pés e garganta quando eu tinha febre. E de repente aquelas festas com gente dançando bêbada e comendo chucrute me pareceu o pior dos pesadelos. É caso para dizer: cuidado com o que desejas, pode ser que alcances.

Capitalismo no seu melhor

Acho um absurdo um país reconhecido pela luta aos direitos dos trabalhadores não ter décimo terceiro. É, engasguem com esta: a França não tem décimo terceiro assegurado pela lei. O que há é um eufemismo que chamam de "prêmio" que pode ser depositado até maio do ano seguinte, sei lá porque isto me lembra alguma coisa a ver com treinamento canino, vá saber. Pois e este prêmio é obrigatório, mas pode ser pago tanto um valor simbólico de 50 euros como pode chegar a um salário (que foi o que o manager do meu marido comentou aquando a assinatura do contrato). Hoje chegou-nos um valor que era um terço do pagamento mensal, e nós ficamos os dois a olhar com cara de tacho para o papel que ele havia aberto. O carro que contávamos comprar com este dinheiro vai precisar de um bom complemento através de crédito bancário. Ah e claro que o carro que sonhávamos comprar é um carro usado e velhote, apenas para o marido deixar de perder os braços pelo caminho cada vez que vamos ao mercado.
Frequentemente tenho divulgado alguns posts do blog no facebook em uma forma de ser a informante não oficial, uma não "emigrante-deslumbrada-que-só-fala-mal-do-Brasil", já que o pessoal que nunca saiu do país não tem a mínima ideia de como é o mundo a não ser através da tv. E se eu falo das coisas boas, é óbvio que não fico quieta com o que não está bem. E o assunto de hoje é: patrões de merda há em qualquer lugar.
O que as empresas mais querem é contratar gurizões que moram na casa dos pais, pagar qualquer merreca porque a falta de responsabilidade não os faz tão exigentes, e ficar com a cenoura lá na frente a dizer ao burro: se te esforçares muito, nós te promoveremos, nós te aumentaremos o ordenado. Se esta estratégia funciona com ingênuos de vinte e poucos, já não é tão eficaz para casos como o do Fernando. 
A festa que eles fizeram no final do ano passado realizada num casino na Alemanha para mostrarem o quanto são generosos, o quanto os lucros foram enormes graças aos" colaboradores", (ai gente adoro esta palavra que patrão inventou para maquiar com uma certa camaradagem enquanto os fode por trás), faz parte da história da cenoura. Pois na dita festa chegou o momento dos homenageados da noite: aqueles caras que quase quase alcançaram a isca, os garotos de ouro da empresa. Aí foram chamados meia dúzia de imberbes ao palco, com o sorriso exultante para receberem um prêmio por conta de sua dedicação. Olhei de soslaio para o marido me perguntando porque ele não tinha corrido mais atrás da cenoura ao invés de ficar resmungando? Já imaginava uma viagem a Seyshelles, ou uma grana boa para comprar um carro ou pagar o empréstimo dos móveis. E quanto mais eu imaginava, mais fula eu ficava. Veio uma moça e presenteou-os com guarda-chuvas. Minha cara foi ao chão e segurei-me para não rir. Eles receberam guarda-chuvas, mas não eram de qualquer tipo, eram de cabos de madeira e tinham o logotipo da companhia. O marido me olhou de volta incrédulo..."se eu tivesse ganho um guarda-chuva por ter feito o melhor que podia o ano inteiro eu mandava eles enfiarem no fiofó (mas foi no cu mesmo que ele disse)". E é assim, no fim de tudo, o pessoal ganhou uma valise e eu ainda pensava que poderiam sortear a tal ida para algum paraíso, quando o Fernando me cutucou: acorda mulher. - Indignado pelos caras terem gasto um horror numa festa ao invés de dar um aumento para os funcionários. - Para que dar viagens se eles ficam felizes com malas e guarda-chuvas e ah, com uma festa num casino da Alemanha? Que fazer? No mundo dos negócios eu não passo de uma besta de uma ovelhinha ingênua.
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