terça-feira, 16 de setembro de 2014

As coisas que o marido conta

Há mais de duas semanas no trabalho novo, ele já reparou em algumas coisas no mínimo inusitadas. O pólo da empresa se situa em um parque de difícil acesso e por isto a mesma disponibiliza navettes* para o povo que não tem carro ou força de vontade no lombo para a subida que é até ali. E é no que o marido vai, mas ele tem um colega que vai de bicicleta, vestindo camisa social, calções de ginástica, meia e sapato de trabalho. Mas não é só isto. Ele chega na sala, onde se encontra a sua mesa e mais cinco, fecha a porta e troca de roupa ali mesmo na frente deles. Eu perguntei ao Fernando: mas e se alguma mulher entrar? Ele diz que as pessoas batem na porta, mas o homem não está nem aí, faz o que tem que fazer com a maior naturalidade do mundo. 
E outra coisa interessante, é o campeonato que os colegas estão fazendo. Logo no primeiro dia, o marido reparou em um quadro de avisos em que estava escrito o nome de todos eles, ao lado de um número. Mesmo intrigado, não perguntou nada. Também não precisou. Nas primeiras horas enquanto tentava se concentrar em ler os manuais da nova linguagem que tem de dominar, ouvia seguidamente uns plaft. Plaft. Pumb. E lá alguém se agitava em triunfo com uma mão para cima, Menos um, ou será mais um? Sim, isto mesmo, eles fazem campeonato de quem mata mais mosquitos, o que naquele lugar húmido e recheado de mato, é o que mais deve ter. Não basta apenas matá-los, tem de erguer os restos diminutos (não sei se ganha mais se tiverem sangue) e mostrar a todos para que se registre no quadro.
O marido decidiu se abster daquilo, uma porque sequer enxerga as aranhas de dez centímetros aqui de casa e outra porque atrapalhado do jeito que é, ainda era capaz de derrubar o computador no chão. Sendo assim, apesar da saudade, eu  que não queria ser uma mosquinha nem um mosquito ali naquela sala... mesmo que fosse para ficar mais perto dele!




* vans

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Às vezes no silêncio da noite...



Para que palavras se tem o mestre?

A turca

Passei por ela duas vezes na subida para a escola. Vinha pendendo para os lados com as mãos na ilharga, o vestido até os pés e o lenço amarrado na cabeça. Lembro-me desde a primeira vez que a vi, há um ano atrás, pensei que estivesse doente tal era o tom pálido amarelado e as olheiras profundas e roxas que a destacavam da aglomeração de pais à espera. Fora isto, a expressão de alheamento, o lábio costurado em uma linha reta a qual nunca vi curva alguma. Não foi nenhuma surpresa quando ela desabou minutos antes do sinal tocar. Alguém soltou um grito, mas creio não ter sido ela. Caiu sem sequer suspirar, os olhos plenamente brancos até ir encontrando ombros pela descida. 
Dias passaram-se, e o seu menino era trazido ou levado por outra pessoa. E quando finalmente ela apareceu, trazia o ventre inchado como se alguém o tivesse soprado na noite anterior. As olheiras ainda mais cavadas na pele sobre o tom pálido de sempre.
Dizem que a gravidez traz um brilho especial a muitas mulheres, olhei-a disfarçadamente e constatei que infelizmente não foi o caso. Às vezes meu lado cusco quer perguntar o porquê daquela tristeza, mas me atenho ao fato de que parece que aquela mulher nem está mais aqui. Se me atrevesse, imagino que minhas palavras caíssem a seus pés bamboleantes, e que ela as pisasse distraidamente  como se o fantasma fosse eu...

Sobre o verão da Alsácia

Tal como aquela velha piada: 
Vai ser bom!
Não foi?


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