sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Sakamoto, posso te dar um beijo?

Não sou de copiar e colar no blog, raramente o fiz, mas isto merece porque é daqueles textos em que se concorda com cada virgula, além de claro, ele dizer bem melhor do que eu. A ultima pergunta que ele deixa no ar, é uma das que mais tenho feito ultimamente e um dos motivos por ter me afastado das redes sociais. Agora depois de ter voltado apenas para não cortar o já frágil contato que tenho com a família e alguns amigos, a minha ideia é cada vez dedicar menos tempo para isto. A minha vida é off line.

Eis que surgem as selfies nos locais dos atentados terroristas em Paris

A maioria dos que estão visitando esses locais querem prestar homenagens aos que faleceram e solidariedade. Outros comparecem para verem e serem vistos. Sem contar os que são guiados pela mera curiosidade mórbida.
Um grupo, contudo, vai a locais de tragédias ou velórios de gente conhecida porque querem fazer parte de algo sobre o qual toda a mídia e redes sociais estão falando – mesmo que não compreenda nada do que está acontecendo.
Querem ir para poderem dizer “estive lá''. Foi assim com parte dos que visitaram nomes como Ayrton Senna ou Roberto Marinho, cujas mortes, como a de Eduardo Campos, foram intensamente cobertas por veículos de comunicação por diferentes razões.
Para muitos destes, a conexão com o mundo se dá através da postagem de uma foto nas redes sociais. Se possível, com uma selfie que é para não deixar margem de dúvida. Caso não mostre a foto a ninguém, o esforço de ter ido ao local não fará sentido algum. Pois, para essa pessoa, a constatação de que aquilo foi real depende de validação externa, a partir do momento em que sua imagem for atestada coletivamente por “likes''.
Se você não postou é porque não esteve lá. E estar “lá'' dá sentido às coisas naquele momento, coloca você no lugar quentinho que é o sentimento de pertencimento. Afinal, o mundo inteiro está falando de “lá''.
Não estou dizendo que isso esvazia a experiência individual e coletiva de viver a catarse causada por ataque terrorista. Também não estou afirmando que existe apenas uma forma de expressar o luto e respeito. Mas esse tipo de comportamento, muito típico das chamadas “gincanas digitais'', transforma essa experiência em algo novo.
Não é a primeira vez que trago essa discussão aqui. Como já disse neste espaço, é possível fazer uma analogia com o comportamento em museus e exposições, por exemplo. Será que as pessoas que visitam esse locais fotografando compulsivamente tudo o que aparece pela frente, ziguezagueando feito uma barata que cheirou uma carreira de coca, realmente se lembram do que viram um mês depois? Ou conseguiram dialogar com o artista? Será que ao menos elas estavam lá?
Pior do que sair fotografando obras de arte de forma alucinada é gravar shows inteiros de música no celular. Perde-se o show para, depois, subir um vídeo tosco no YouTube a fim de validar a presença publicamente.
Enfim, capturar é mais importante que sentir em um mundo em que ter é mais relevante que ser. A impressão é que a memória vai sendo transferida, paulatinamente, da cabeça para cartões SD ou para as seções de fotos nas redes sociais, tornando-nos cada vez mais dependentes disso para recriar nossas vivências.
O mesmo se aplica a viajar. Para muitos, conhecer uma nova realidade é ir ticando uma lista de ícones – “pronto, já vi'' – derivados de guias simplistas ou matérias de turismo duvidosas que reforçam a caça ao tesouro. Sem considerar, é claro, uma vida inteira de bombardeio de padrões pela mídia, em programas de auditório ou comerciais de TV, que deixavam claro que se foi à Roma e não visitou a Basílica de São Pedro (mesmo que ache aquilo um porre), você não viu nada, é um pária social.
Quantos têm coragem de dizer não e fugir da manada?
Quantos conseguem alterar a programação a qual foram submetidos por anos?
Quantos percebem que a vida basta em si mesma, sem necessidade de validação?

Daqui:http://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2015/11/19/eis-que-surgem-as-selfies-nos-locais-dos-atentados-terroristas-em-paris/

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

sábado, 14 de novembro de 2015

Paris

Acordei com mensagens no telefone perguntando se eu estava bem. Não sei se as pessoas sabem, mas moro a oito horas de Paris, e prefiro pular aquela parte em que fingimos se importar e damos condolências mecânicas: oh que horror, meu Deus! Não que não tenha sido horrível, mas aqui está tudo igual, se não fossem as notificações do Le Figaro no tablet do marido, só tínhamos visto de manhã (às vezes a ignorância é uma bênção).
Quebrei minha promessa de ficar longe, mas não consegui resistir visitar o grupo de brasileiros em Paris no facebook, o qual faço parte. Aquilo dava uma tese antropológica, sério. 
Acho incrível como a burrice e a pressa em tomar lados os faz pensar que a extrema direita é a solução para resolver o terrorismo. Vou ser conscientemente preconceituosa nesta frase, mas é o que penso: a maioria dos emigrantes brasileiros na França são povo de pouca instrução, de mente tacanha e agressiva. São dotados do mais alto grau de viralatismo e acham-se vejam só, que fazem parte de uma outra estirpe de emigrantes. Quando conseguem papéis, acham que estão por cima da carne seca e quando conseguem a cidadania, deixam de ser brasileiros para serem apenas franceses. Tomam as dores dos franceses (dos xenófobos, principalmente) e clamam pela Le Pen esquecendo-se que legalizados ou não, serão sempre emigrantes.
Os mortos já estão mortos, volto-me para os que ficaram e penso nas consequências destes atos. Por mais que se diga que não devemos generalizar, a verdade é que o outro sempre foi um problema social. O outro historicamente e culturalmente exerce um papel de coesão no imaginário de uma determinada coletividade. O outro é aquilo que nós não somos, é aquilo que repudiamos quase de maneira instintiva. Desde as cidades-estados da Grécia antiga e até muito antes da escrita, o outro, o estrangeiro, o não-pertencente, serviu de espelho para a construção e consolidação de nossa identidade e por isto, rejeitá-lo em diversos graus faz parte da dialética de nossa formação. 
O outro também tem um papel importante: quando a coisa aperta, é preciso achar um culpado fácil, um vilão comum a quem o povo possa concentrar toda a sua revolta e insatisfação. Oportunistas sedentos de poder oferecem-lhes a cabeça do outro de bandeja certos de que ocupados em odiar, o povo fará o que eles quiserem. 
O meu maior medo talvez não seja o maior medo das pessoas, não é de outros atentados isolados, embora isto seja fácil de dizer morando em uma cidade do tamanho de uma ervilha, mas do crescimento da intolerância com relação aos emigrantes e que isto acabe gerando intolerância dos emigrantes para os nativos e depois isto continue até todo mundo estar se odiando sem saber bem o porquê.
 Eu sou o outro aqui, por mais que esteja legalizada, por mais que contribua com os impostos. Não há para a extrema direita, emigrantes e emigrantes, há tão e só emigrantes e eles não os querem aqui. Simples como isto.

Adoro!

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