segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Também nunca achei Jeanyne na latinha

 Uélerson é um nome bosta e eu tenho consciência disto! Kkkkk!

domingo, 29 de dezembro de 2013

Elisa (parte final)

Stephane acariciou o rosto de estátua da mulher. Tinha os cabelos negros espalhados pelas costas que desnudavam apenas parte dos seios. Passou a mão pela cintura, pelas coxas que o tempo tinha tratado de tornear. Já não era mais a menina assustada que ele havia tomado a virgindade. Ela soltou uma palavra indecifrável e virou-se para o outro lado. Ele voltou a cobri-la com cuidado, lhe pedindo perdão enquanto o fazia. Passou pelo berço onde dormia seu filho e admirou quem sabe pela última vez, o sono tranquilo do bebê. Retirou o anel, presente do rei  quando salvara-lhe a vida, e depositara em cima da mesa ao lado do jarro d'água. Não havia conseguido dormir nada depois que fizeram sexo, passou a maior parte do tempo vigiando os suspiros que Elisa soltava durante o sono. Mas já era tempo de se ir, vestiu-se e amarrou com cuidado o saco de moedas de ouro em uma bolsa na sela do animal. Deixou algum dinheiro sob o colchão na esperança que a esposa o achasse antes de trocar a palha. Porém temia que tal não fosse necessário, provavelmente Philippe lhe tomaria a propriedade, dando-a para quem lhe trouxesse sua cabeça. Rezava para que poupasse a vida da mulher e da criança, que nada tinham a ver com sua traição e parecendo que não, o fato de ir sozinho ao invés de um ato de egoísmo, era a melhor forma de garantir a segurança de sua família. Era  ele quem o rei queria e levá-los só o atrasaria, tornando o trabalho deste mais fácil. Ao menos Vianca teve a amabilidade de mandar sua aia de confiança avisá-lo há três dias. A mulher trazia nos olhos azuis o medo da rainha. Trêmula lhe implorava para que fugisse e salvasse sua vida. O rei havia demonstrado nos últimos tempos o quanto estava desgostoso com a origem do herdeiro. 
Stephane nunca soube o quão providencial fora a decisão de partir no meio daquela noite de lua cheia, em que conseguiu pela claridade, tomar atalho fora da estrada real, sempre com cuidado para não ser surpreendido por algum grupo de ladrões. Fora vestido com roupas simples para passar-se por um  mero camponês, embora tivesse de ter cuidado constante para ocultar o porte imponente de cavaleiro real. Encurvou-se sob a capa de lã e galopou até o dia virar noite novamente, só parando para deixar o animal tomar água.
Quando Elisa viu o homem baixo e calvo a entrar em sua casa, ficou por instantes atordoada. Marie pegava a criança que chorava lá dentro e ela ao ver o brasão da casa Gautier rapidamente percebeu de quem se tratava e fez uma vênia meio atrapalhada pelo susto. 
- Em que posso servir meu Senhor?
- Procuro por Monsieur Stephane. Diga-me onde ele está. - Falou rispidamente a cuspir-se o rei. Elisa levantou o rosto e evitou limpar a saliva que ele lhe tinha jogado.
- Juro pela Virgem, não sei onde ele está. Pensei que era a notícia de sua morte que me traziam. Faz dois dias que não o vejo. Por favor meu Senhor, se souberem do paradeir... - Philippe retirou a mão para que a mulher não a beijasse. Virou-se para os homens que naquele momento voltavam para os cavalos não tendo achado indício nenhum do traidor:
- Peguem esta mulher e a criança também!
Dois homens grandes e fortes a carregaram para a garupa de um, não fazendo qualquer esforço frente sua resistência concentrada em um metro e cinquenta de raiva e medo. Outro arrancou das mãos da criada o menino em prantos. Foi com o olhar desfocado que viu por entre lágrimas, a casa de pedra e janelas exíguas ficar cada vez menor no horizonte e apesar de não enxergar mais nada, sabia que Marie ficara em pé, toldada de surpresa e choro. As lágrimas inofensivas, além de às vezes a própria vagina, eram infelizmente as únicas armas de uma mulher.
Elisa fora jogada e trancada juntamente com Dominic em um dos quartos de hóspedes do castelo. Não lhe falaram nada, nenhuma explicação para os tratarem como cães, mas desconfiava que aquilo só podia ser coisa de Stephane. O que havia aprontado para o rei? Roubou-lhe algo? Ao cair da noite, uma criada entrou com uma bandeja de sopa e um punhado de pão para dividir com o pequeno. Trouxe mais tarde, panos e água morna para lavar o bebê que já tinha se borrado pelas pernas, e permaneceu na tarefa calmamente enquanto Elisa comia o resto da sopa. Depois agarrou no menino e ia abrindo a porta quando a mulher lhe puxou o braço. A criada apenas balançou a cabeça com olhar maternal, como a dizer, não adianta de nada minha querida e garantiu-lhe com um olhar de ternura que não maltrataria Dominic. 
Elisa sentou-se na cama com o olhar fixo na lareira, as paredes eram tão frias e úmidas que tinham de acendê-la o ano todo. O fogo levantava labaredas como um réptil a alçar as pedras enegrecidas pelo tempo, encolhia-se e espreguiçava ao sabor da brisa que entrava pelas frestas da janela. Do outro lado do aposento, uma vela morria aos poucos iluminando palidamente o leito e a mesa onde se encontrava. A porta abriu-se de assalto, tirando a moça de sua hipnose voluntária pelas chamas. Philippe puxou-lhe os cabelos e enfiou a língua para dentro de sua boca. Empurrou-a para cama sem dizer nada e ela em um mutismo resignado, deixou que ele amargasse a raiva em seu corpo por uma e outra vez. Foi assim durante todas as noites em que a manteve em cativeiro, deixando que visse seu filho apenas em raros momentos. Até Elisa notar a falta de seu período, e por ironia, a prisão que lhe tinha sido a gravidez anterior, fora o que a libertou desta vez. Pôde enfim andar pelos corredores e frequentar os jardins internos do castelo. Olhou para  o céu que se abria para o sol fugaz da manhã. Nos bancos, perto da estátua de um querubim, estavam duas mulheres a conversar animadamente e aos seus pés, Dominic brincava com outro menino mais novo. Elisa aproximou-se devagar, e à medida que o fazia, envergava um sorriso do tamanho da ansiedade que estava de pegá-lo ao colo. Já falava e corria com a audácia que os dois anos traziam às crianças. As duas cabeças escuras a balançarem os caracóis passaram em sua direção aos guinchos de alegria. Elisa estacou ignorada no meio, mas pode surpreender-se com o rosto muito semelhante dos dois. Foi então que entendeu o porquê de tudo aquilo. Os olhos da rainha, duas pedras jade a observá-la, convidou-a a sentar-se ao seu lado, certa de que apenas naquele momento a jovem tomara conhecimento da verdade. Elisa sem saber de si, assentiu e deixou que a outra pegasse em sua mão e entrelaçasse os dedos nos seus. 
- Fernand e Dominic serão grandes amigos. - Ainda achando a situação caricata demais para ser real, Elisa preferia o silêncio. - O Senhor Philippe não desistiu de procurar por Monsieur Stephane, mas irá...com o tempo. Já enforcou metade da vila que ousou duvidar de minha fidelidade e o resto acabará entendendo que isto é muito melhor do que deixar o reino dilacerado por não ter sucessor. Acalma-te, criança. - Ao ver que ela chorava sem conter os soluços, Vianca puxou-a para seu colo. - Vai ficar tudo bem. Que seria de nós mulheres se não nos aliarmos umas com as outras? Philippe já lhe fez um filho, estão quites os dois. Calma...calma....pshhhh....eu sei...vai ficar tudo bem... 
Elisa chorava pelo filho sem nome. Chorava por ela mesma, virada em concubina do rei,  sem casa e com um marido traidor da coroa, chorava por seu ventre agora transformado em instrumento de vingança. Chorava por não ter escolhido o convento e por saber ao mesmo tempo que a outra opção não seria tão melhor que aquela. Chorava porque tinha a certeza que choraria até o dia de sua morte e que possivelmente nem ela lhe livraria de tal maldição, a de não ter nascido com um membro entre as pernas. E era ridículo como um pedaço tão pequeno de carne, fazia tanta diferença na liberdade de alguém. E chorava...



* Como tinha dito, esta história foi baseada quase que totalmente em um sonho que tive e é uma pena que tenha acordado sem saber o que houve depois disto. O que aconteceu com Stephane, com Elisa e Dominic, se voltaram a se encontrar, se fugiram, se o mataram...não sei. Ficou apenas a insatisfação das histórias sem final e o marido sabe como fico quando assisto um filme assim.



Comigo é assim

Falei uma, duas e três vezes e já não me interessa se é de propósito ou não. Pela terceira vez meu sofá branco foi riscado e a minha resposta foi: desenho em casa nunca mais. Para o diabo que a carregue "expressão artística", se quiser desenhar que o faça na escola. Aqui não tem palminhas para sofás riscalhados, nem moldura em parede pixada. Aqui tem educação, pois que se não for assim daqui a pouco estamos como? O rapaz já quebrou a tv de plasma da minha mãe e lá não pude fazer nada porque não deixaram, mas aqui... ai ai, ele que não pense nisto ou vai lembrar-se por muito tempo. Acho o "Ó" os pais que aplaudem estas "artes" dos filhos, e soltam um resignado "crianças são assim mesmo, querias  o que?".  Será que há meio século atrás era assim ou as crianças andam com as manguinhas muito de fora ultimamente e ninguém quer fazer nada por isto? Pois aqui não.

sábado, 28 de dezembro de 2013

Elisa (parte 6)

Era uma tarde morna de verão quando o rei aproximou-se de seu fiel amigo. Tinha os poucos cabelos loiros que emolduravam a careca a reluzirem no sol. Stephane notou que depois da última campanha, esta tinha aumentado ainda mais. Philippe tomava largos goles do vinho em um cantil de couro com o bico trabalhado em prata. Ofereceu-lhe, mas ele recusou. Não sabe se era do calor ou da saudade da mulher ou do medo de ser descoberto, mas ultimamente fazia o possível para não beber, principalmente quando estavam apenas os dois.
Philippe quebrou o silêncio com sua voz pastosa:
- Parece que vou ter outro filho.
- É mesmo? Parabéns...e que seja homem! - Falou sem demorar-se nos olhos azuis do rei.
- O que houve meu amigo? Não está feliz com o teu rei? 
- Não é isto... - disse o cavaleiro vacilando no tom de voz. - É que faz muito tempo que não vejo os meus. Minha mulher não mandou notícias da última vez que o mercador por lá passou. E a novidade fez-me lembrar do meu pequeno, imagino que esteja quase a andar por suas próprias pernas! - Philippe estalou os beiços pensando que a missão do amigo já tinha terminado há mais de duas luas. Não tinha razões para prendê-lo por mais tempo.
- Então façamos assim: ficas até a festa de anunciação e depois vais para casa. Que tal? - Deu-lhe dois tapas nos ombros como permitia uma amizade que ia desde a adolescência. Amizade esta que a estupidez de sua rainha estava prestes a desmoronar.
Stephane aceitou desta vez um pouco do vinho e nunca o líquido desceu-lhe tão mal pela garganta.
Dominic enchia as mãos de terra e ria quando Marie tentava impedi-lo de colocá-las na boca. Elisa observava da janela enquanto fiava um fio muito fino e tingido de amarelo, que serviria depois para mais uma roupa para o filho. Ao longe na estrada de pedras, aproximava-se o cavalo negro do marido, era uma imagem tão esperada que quando finalmente se tornara real, ela não conseguia acreditar. Dez meses e alguns dias era o que os havia separado. Quando ele partiu, Elisa viu-se livre pela primeira vez na vida e ao invés de ficar imensamente feliz sendo senhora de si mesma e da sua própria casa, começou a sentir um vazio estranho. As folhas balançaram nos galhos, o frio chegou, a chuva, a neve, o orvalho. O sorriso do filho, as gracinhas, viu que já sentava sozinho e agora tentava por-se em pé segurando-se  nos móveis. Quando olhava para Dominic ainda lembrava mais do pai, ele tinha os seus olhos, a sua boca e os cabelos em caracóis. Fora tanto tempo a sonhar com sua vinda que agora era difícil acreditar que ele finalmente voltara. A pergunta agora era "por quanto tempo"?
O marido apeou do cavalo já com os dentes em fileira, agarrou no bebê que o olhou curioso e lhe apertou o nariz. Stephane sorriu e voltou a pô-lo no chão para agarrar a esposa que se encontrava estacada na porta. Pegou-a no colo e mordeu seus lábios com fúria:
- Achava que te livravas fácil de mim, minha pequena? - Elisa viu-se agarrando seu pescoço e permitindo outras demonstrações de carinho.
A mulher gemia quando a outra lhe amarrava o ventre. Todas as manhãs Vianca se submetia a esta pequena sessão de tortura, pois era a única maneira de tornar credível que aquele filho que esperava era legítimo. Às vezes virava para a criada e dizia para apertar mais.
- Mas vai fazer mal ao bebê minha Senhora...
- Aperta! - Dizia com a voz entrecortada de dor.
Tinha certeza de que esperava um menino. Tivera um sonho um mês antes do marido partir, em que via um homem de peito largo e cabelos escuros a vir em sua direção com o pênis ereto. Este homem dizia para que deitasse que ia lhe dar o que o frouxo do seu marido não conseguira. Vianca acordou sobressaltada e ao mesmo tempo com vergonha e molhada de desejo. Não viu o rosto do amante, nem encaixou-o em nenhum dos homens que cruzava diariamente, mas quando o rei anunciou que  ia deixá-la nas mãos de Stephane, seu melhor cavaleiro, fez-se luz.
Com a chegada da décima lua, Vianca viu concretizar-se o maior desejo de uma rainha, a parteira lhe estendia entre panos ainda úmidos de sangue, o menino que havia lhe sido prometido. Chorava de alegria. Era mais de dez anos de tentativas frustradas, de cochichos nos corredores de que tinha o ventre amaldiçoado, de preocupação do marido a pairar sobre alguma disputa futura e provável desmantelamento de seu reino, caso não conseguisse uma boa aliança através de Aurélie. Agora finalmente podia sentir-se segura ou pelo menos o que permitisse de segurança a alta mortalidade infantil daqueles tempos. Se tudo corresse bem nos primeiros anos e se a peste mantivesse-se afastada dali, era bem possível que ele chegasse a rei.
Quando levaram o bebê para Philippe, ele o carregou e foi em direção à lareira para vê-lo melhor. Não perecia nada com um prematuro, embora ele não soubesse grande coisa de prematuros, sabia de outros três bebês de termo que havia segurado anos antes. E este lhe parecia bem robusto, tanto quanto suas filhas o foram. Perscrutou os olhos cinzentos e indefinidos do recém nascido. Talvez ficassem verdes... Depois reparou nas bochechas rosadas e no cabelo negro. Aurélie tinha os cabelos assim quando nasceu e depois caíram para darem lugar a uma cabeleira loura e farta. Suspirou, antes de devolvê-lo para os braços da aia.
- Diga para a Senhora Vianca que é com muita satisfação que o nosso herdeiro carregará o nome do meu avô. Ele vai se chamar Fernand Gautier. - A moça assentiu e saiu silenciosamente, fechando a porta logo atrás de si.
Os meses passaram e a desconfiança aumentava para Philippe. Os cabelos do pequeno Fernand cresciam ainda mais escuros e formavam pequenos caracóis nas pontas. Procurava em vão a lembrança de algum parente a quem tivesse puxado e pela sua parte não fora. Os olhos eram de fato verdes como os de sua mãe e por mais que procurasse parecenças entre eles, sentia ao invés disto, uma raiva crescente em direção à alegria incontida de Vianca. Sabia que a mulher tivera amantes, durante sua vida conjugal ele não fizera questão de conquistar sua simpatia, muito menos o seu corpo. No entanto ela tinha conhecimento de que seus casos, tanto como os dele, tinham de ser discretos e mais ainda, não poderiam nunca lhe trazer um bastardo à porta. No fundo sabia que aquele menino não era seu, mas e agora: continuava com a farsa ou ameaçava tudo que sua linhagem conquistara até então? À medida que as pessoas iam tomando ciência da aparência do futuro rei, cresciam rumores de que este podia não ter legitimidade para reinar. Já cansado de ser alvo de intrigas, Philippe encostou literalmente Vianca à parede.
- Não sei do que o Senhor está falando. Este filho é teu, o sangue dos Bourdignon e Gautier lhe corre nas veias!
- Vou perguntar pela última vez antes de eu mesmo começar a apunhalar tuas criadas pessoais. - Calmamente o homem retirou a adaga e depositou no leito da esposa. Vianca tinha os cabelos soltos e suados, seu peito pulsava ao ritmo do galope de um garanhão selvagem. - Quem é o pai deste menino?
- Posso contar, mas o Senhor promete-me que não irá matá-lo?
- Prometo.
- Foi Stephane... - A mulher deixou cair o seu nome no silêncio carregado da expectativa do marido.
- Desgraçado...como pôde? - Esbravejou o rei ferido de forma fatal em seu orgulho. Poderia esperar de qualquer um, de François, o capelão, de Marc, o chefe da guarda, de qualquer camponês ou harpista, mas nunca dele... Jamais dele... Especialmente ele a quem confiava sua própria vida, suas filhas e seu espólio. Na verdade parte dele sabia, o rapazinho puxava-lhe o tamanho e muito de suas expressões. Se passasse mais tempo com ele, teria chegado a esta conclusão sem ao menos ter de perguntar à Vianca. Guardou novamente a adaga com os olhos pregados no rosto pálido de sua algoz: Vou matá-lo.
- M...mas tinhas dado a tua palavra de honra que não farias nada...
- E não vou fazer nada...ao menino. Já ao pai...nunca te alimentei esperanças, minha Senhora. Tu mesma é que o fizeste. - disse isto e saiu com meia dúzia de homens para além dos muros altos e sombrios. E a rainha desconfiava que o coração do marido jazia igualmente em um fosso tão fundo quanto o que separava o mundo do castelo de pedra.

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