quinta-feira, 29 de maio de 2014

Fabionices

O pai lendo o livro das letras:

- Fabian, "A" de...?

- Belha!

Feriado

A gente percebe que já está um pouco adaptado com a cidade quando começa a ter fobia de turista. E o sentimento se impregna tanto nas ventas que chego a entender os parisienses que os tem em maior proporção. Então quando se passa pelas ruas estreitas do centro e tem de se desviar da excursão de alemães na terceira idade com seus passos miudinhos e sem pressa, ainda mais miudinhos e sem pressa quando avistam a carroça do sorvete coincidentemente ali atrolhando a rua, ou sacando das lentes enormes para tirar uma foto dos prédios velhos de janelas desproporcionais. 
Hoje é feriado na França, mas tal como nos domingos em que os shoppings tem as portas completamente fechadas (e não apenas a praça de alimentação em funcionamento), só nos resta caminhar sem rumo pela cidade. Colocamos o Fabian no carrinho e fomos por umas duas horas, sem esquecer de parar no sorvete de sempre, em  que a menina que atende já nos recebe com um "bom dia" com sotaque francês. 
Quando já estávamos voltando, as previsões do marido que desde ontem olhava para as nuvens roxas e sentenciava que ia chover, finalmente se concretizaram bem no meio do nada. Podíamos ter pego o tram há dez minutos atrás, mas de qualquer forma ainda teríamos da nossa estação uma boa pernada sob a chuva torrencial. E por falar em chuva: caía em pingos grossos e a luz  refletida do por do sol dava a impressão de que tudo estava em câmera lenta.  A vida deve ser mesmo esta mistura agridoce, este encher-nos de frio e ao mesmo tempo nos trazer o melhor perfume da primavera, o cheiro de terra molhada. Os últimos minutos foram a imaginar o café quente a descer, a roupa macia e seca a nos envolver o corpo, mas principalmente eu a tirar a sandália que me massacrava os calcanhares. E é claro que como toda boa chuva, ela terminou exatamente no momento em que pusemos o pé em casa.

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Aprender?



Volta e meia vozes se levantam contra a adultização das crianças e eu dou razão em parte. Não creio que seja benéfico preencher todos os horários mal deixando-lhes tempo para brincar, no entanto fico ao mesmo tempo pasma com a forma inflexível desta outra visão: a que prega um retorno idílico ao que (pensam que) foi a infância paterna. Meu filho estuda em uma turma mista que vai dos três anos aos cinco. Portanto é normal que ele tenha lições de como "desenhar" letras e  números, assim como saber a primeira letra que compõe o seu nome. Não vejo nada de mal nisto, sério. Ele adora "escrever" no quadro que demos a ele e agora tem estado muito feliz a preenchê-lo de quatros por todo lado. Sabe todo o alfabeto francês de cor através das músicas que a professora os ensina e que ele pede para pormos no youtube. Mas não é por ele saber estas e estar aprendendo outras coisas que sua infância não esteja sendo respeitada. Pelo contrário, o estado de sujeira e furos nas calças com que chega em casa, é uma prova de que ele mexe-se, corre, anda de bicicleta,  vai atrás do seu amigo inseparável, and so on.  Esta história de que ah as crianças não devem saber isto ou aquilo, devem apenas brincar eternamente parece-me coisa dita por pais de crianças que não costumam se encaixar neste processo de aprendizagem. E inclusive acredito que há até um pouquinho de ciumeira, pois do contrário o discurso mudava para apregoar a inteligência e o destaque dos seus filhos, não há nenhuma dúvida. 
Na creche que o Fabian frequentava no Brasil, que se baseava nesta linha de pensamento do brincar sem limites, não possuía imagens de animais nas paredes, nem eram-lhes ensinado absolutamente nada a não ser fazer bolos e deixá-los correr (isto para crianças entre três e quatro anos). Não gosto nada destes extremismos porque isto me remete à ideia de que as crianças não tem de aprender, e sei que elas não tem ainda a real necessidade de saber o zoo inteiro, mas é desde pequeno que se estimula a descoberta e daí a importância de se começar por algum lado. Estas pessoas e estas listas tão amplamente divulgadas nas redes sociais, que dizem o que uma criança deve aprender na primeira infância, ou seja apenas brincar e ter tempo com os pais, na minha opinião são tão redutoras quanto a ideologia a que se contrapõem. Não levam em consideração que há crianças que desejam mesmo saber até mais do que lhes é proposto (como é o caso do meu filho quando descobriu as letras) e nem que quando eram os pais crianças também andaram a contornar vogais com linhas e feijões e nem por isto deixaram de ralar joelhos e colecionar roxos pelo corpo.  

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