segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Voltar

Olhei por alguns minutos o campo para preencher sobre quem chamar em caso de emergência. Conferi e de fato lá tinha escrito os telefones meu e o do pai no canto superior da folha. Não, não há mais ninguém para quem recorrer. Deixei-o ficar. Vazio.
Por diversas vezes me tinha passado esta pergunta: será que um dia vou voltar? Eu que amo tanto meu país e minha cultura... Se antes foi uma necessidade quase absurda como respirar, hoje me parece um pulsar surdo, antigo e cada vez mais fraco. Afinal, voltar para quê? E para quem? 
Aquele tempo no Brasil me fez pensar no quanto é ilusório o que considero o mais pueril de todos os laços que prendem um emigrante: o emocional. O buscar na família e amigos o seu maior motivo para o retorno. Vai ver eu tive azar. A maior parte da minha família não merece que eu tome uma decisão tão importante pensando nela. E os amigos...bem, os amigos seguem a sua vida, os que não se afastam, vão por vezes telefonar ou comentar uma foto no facebook. As minhas amigas no geral e nem tinha muitas a bem da verdade, conheceram outras pessoas e hoje eu não passo de mais um nome na lista do WhatsApp. Se eu pensasse em voltar por causa delas, estaria com as expectativas muito baixas com relação ao sucesso deste retorno.
Ninguém que pensa em voltar imagina que aquele mundo que se deixou para trás, cinco, dez, vinte anos, já não existe mais. Aquelas noites que se passaram tão bem nos bares da Lima e Silva, o xis do Cavanhas, as lojas preferidas no shopping. E se os lugares que frequentamos ainda permanecem os mesmos, a gente não. Nunca nos disseram que nós morremos em um ponto qualquer no caminho para o aeroporto. Na realidade nós não voltamos, é impossível voltar ao ponto de partida.
Para mim esta imagem romântica da "volta" se esvaneceu ao mesmo tempo em que eu abandonei estas relações-fantasma ao deixar o Brasil (novamente). Hoje penso que onde houver dinheiro, vivemos bem. Principalmente onde houver dinheiro e calor. Seria capaz de voltar para o Brasil, porém isto envolveria muito, mas muito mais dinheiro, o que eu imagino que aconteceria somente se o Fernando acertasse o Euromilhões. E quem me garante  que não iria deixar também em branco o telefone como o deixei na escola do Fabian? 

domingo, 15 de fevereiro de 2015

Não entendo

O povo passa o ano todo reclamando que não tem dinheiro, mas quando chega o verão não sobra ninguém na cidade...

A felicidade é um laço cor-de-rosa

Alguém devia denunciar isto, este eletrodoméstico do demônio. Será que algures em uma sessão de pastores rodopiantes já não o condenaram à maldição? Bastou ligá-lo sexta, para que o Fabian se transformasse em um diabo da tasmânia, aliás, esta é a forma com que usualmente o diagnostico quando o estado de excitação/má educação normal atinge à loucura. Pula, grita, acha que é um super herói qualquer. Falo trezentas vezes para me deixar limpar a porra da casa. O aspirador deve ter algum efeito hipnotizador junto com o seu barulho insuportável.  Gritei eu, gritou ele, mas nem um valente tapa na bunda o fez sossegar. Dois dias sem ir à escola por conta de uma gripe que empesteou eu e o Fernando, cansaço, anos sem liberdade, sem momentos à dois, tudo me passava pela cabeça enquanto o vácuo do aspirador enchia meus ouvidos. Quebrou a peça de encaixe que liga o aparelho ao cano de limpeza. Deve ser a raiva ou a pão durice de achar que seria boa ideia comprar um de 29 euros. Depois de minutos, chega o marido e não sabe muito bem o porquê do meu estado de nervos, já que o filho é tão querido e tal. Ontem bastou algumas horas à tarde enquanto eu deitei no quarto para ouví-lo berrando que isto não podia ser e o tal "querido" a aprontar mil e uma como se fosse uma coisinha selvagem. 
Em meio a isto lembro-me daqueles conselhos sobre educar e só me dá vontade de rir. Ponham lá o senhor ou a senhora expert em amestrar crianças à prova com o meu diabo da tasmânia um mês. Ah mas não é um mês com "escapadas" para o Dubai, com jantarzinho romântico e babá a la carte. Não, ponha lá com dedicação 24 horas, sem parentes a quem recorrer, sem dormir direito ( aqui até hoje o Fabian acorda três vezes ou mais e termina por dormir na nossa cama). Mergulhem lá na nossa vida doutores! Vão ver o quanto é enriquecedora esta experiência e se não enlouquecerem, dou-lhes um pirulito. 
É por esta razão que tenho verdadeira alergia a estes mestres da pedagogia, estes e os blogs fofinhos-rosinha-ser-mãe-é-tão-bom. No que diz respeito aos últimos, é ainda mais evidente o quão irreal é aquela atmosfera de revista que pretendem criar. A mãe fala de sua vida de uma forma tão imbecil que sinto que está falando a língua dos bebês: óin voxês naum acham qui o baby M. é lindaum?! E baby M. cheio da grife carezézima que nem assim o deixa bonito. Enfim, a mamãe blogueira se esforça, tira fotos instagramizadas, mas é um fato que os bebês crescem e deixam de ter graça. Mas não passa de coincidência quando ao perder as visitas, a cegonha venha visitá-la outra vez. Mas Bonitinha, não seria muito sem noção ter filhos só por causa de um blog? Pois eu acho que destas eu espero qualquer coisa...
 Ainda ontem falei com uma amiga que está querendo muito ser mãe, estava comentando que não entendo aquelas pessoas que acham que filho salva casamento (tendem a ser mais eficazes em blogs ao menos). É justamente o contrário! Se um casal não estiver muito certo do que quer e bem equilibrados tanto financeiramente quanto emocionalmente, sinto muito, mas é apenas uma questão de tempo (para ser a mãe a ficar sobrecarregada com aquele filho).
E se espera tanto, mas tanto da mulher e quase nada do homem, que estes dias viralizou uma reportagem de um pai não ter desistido da filha com síndrome de down. E toca aplaudir o cara por não fazer NADA mais do que a obrigação dele. Nem preciso dizer o leque de adjetivos fofos com que a mãe da criança foi chamada. Deve ser duro mesmo para o homem né, para cada centenas de mulheres que são abandonadas com filhos saudáveis ou não, este resolveu cumprir o seu papel: um grammy de super pai para ele!
E a corrente das mulheres grávidas contra o aborto? É tanta coisa que me tira do sério que é por isto que na maioria das vezes prefiro ficar quieta. Mas agora o que realmente interessa: o que eu faço com o aspirador hein? 

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

Queremos sempre uma razão

Alguém se jogou na frente do trem em Villeneuve Loubet, ele disse. Conseguiu uma carona com um colega e está vindo de carro...sabe-se lá quando terá trem novamente. Não conheço, não sei se é jovem ou velho, nem o porquê. Terá planejado ou este foi um dia em que perdera as forças de remar contra a maré? Terá alguém que deixou para trás? Filhos...esposa? Ou este talvez tenha sido o motivo porque tornara seu destino tão irreversível?
Por que? E importa? Não haverá trem por muitas horas e a culpa me assalta por sentir alívio de que ele volta para casa são e salvo.
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