segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Prólogo

O pulso estava nu. Havia despido o relogio que ele lhe dera no seu aniversario. Olhou brevemente para o espelho salpicado de pequenos pontos de pasta de dente e desta vez não sentiu o impulso de limpar. “Para quê?” O primeiro que deparasse com a cena certamente não ia preocupar-se com aquela mancha, mas por certo repararia no rio avermelhado escorregando de seus braços. Toda a vida escorrendo por azulejos brancos, se entranhando nos rejuntes que ela esfregara semana passada. Cada gota guardaria algum momento passado? E se guardasse, à medida em que lhe iam abandonando, a cabeça ficaria mais leve ante o inevitável?

Catherine  tinha a mão trêmula quando agarrou na lâmina; poderia ter escolhido qualquer faca de cerâmica  da cozinha, mas escolheu o canivete suíço: ele garantiu-lhe que jamais a deixaria na mão. Soltou um riso torto, no eco do banheiro pareceu mais com um grunhido do que um som humano. Queria que sofresse.
Iria ao menos vê-la neste dia? Ou mandaria uma floricultura entregar coquelicots pela internet enquanto comia uma qualquer puta de uma atriz americana? Ou em um dia bom, telefonaria para que segurassem o enterro até a hora em que tivesse acabado as cenas às margens do rio Drá? E depois? Depois…
Encostou a cabeça levemente sentindo a parede gelada provocar uma onda de arrepios pelo corpo todo. Os bicos dos seios beijaram o forro da camisola de cetim e de um rasgão da pele branca brotou uma fita vermelho escura. Fechou os olhos torcendo para que o tempo escoasse depressa, mas quando tornou a abri-los, encontrou tudo no mesmo lugar exceto por duas gotas no chão.
Olhou novamente para o canivete e viu que ainda não havia resquicio de sangue, moveu-o fazendo o reflexo  iluminar-se como uma estrela presa em seu espelho. “Não consigo.” Não pusera força suficiente para tal. O calmante começara a fazer efeito e Catherine sentia a cabeça a encher-se de líquido. Em breve lhe taparia a boca, os ouvidos...e quando chegasse aos olhos seria tarde demais.  
Bamboleou para o quarto fazendo o possivel para não olhar para cima. Sentia os seus olhos postos nela. A penugem dos braços tornou a eriçar-se, tropeçou em um par de sapatos ao pé da cama e por muito pouco conseguiu evitar os dentes de se encontrarem com o piso. Mesmo com a luz apagada e somente um fio dela vindo da porta do banheiro, conseguia sentir o meio sorriso de troça por cima dos ombros.
- Você - explodiu em soluços - Está feliz agora? Eu devia pegar isto e lhe furar a cara...que acha? 
Agarrou debilmente a lâmina e pôs-se a subir a cama arrastando-se. A cada centímetro seu pulso depositava flores carmim nos lençóis. Coquelicots. A meio metro de chegar até ele, fraquejou. Era como se todo o seu corpo se tivesse enferrujado e seus membros não mais lhe pertencessem. Foi sentindo os olhos pesados.
- Não...não...eu tinha...que acabar...com isto...
Ergueu o dedo para ele. La do alto o homem observava, escondido e sorrindo. Ha séculos sorrindo.

sábado, 7 de fevereiro de 2015

Se...



Eu falasse tudo o que penso não ia prestar, então prefiro ficar quieta. Estou em um momento sem paciência nenhuma, sem empatia nenhuma com ninguém. Estou ansiosa para que um projeto que sonhei por mais de meio ano se realize e esteve quase, mas infelizmente vamos ter que adiar por algumas semanas. São apenas três, procuro me acalmar...depois acabo por pensar que são mais três semanas longe do meu objetivo. E volto a me irritar como se tivesse sempre à espera de outro imprevisto. 
Estive entupida, cheia de palavras agarradas na garganta. Uma das coisas que me fez perder um pouco o interesse de falar por aqui, foi a desconfiança que um familiar do marido andasse xeretando, e se eu não quero que a família dele saiba da nossa vida, porque colocar aqui de bandeja? 
Enfim...não vou desistir, sei que depois vou sentir-me melhor. Só mais um pouquinho de paciência...

quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Ai que ousadia!



É complicado ser gorda em um país de magros. Sair de casa é, parafraseando Narcisa Tamborindeguy, uma ousadia. Para começar nas roupas: cheguei em um estado que fui obrigada a pegar emprestado os casacos do marido. O conjunto fashion se completa com umas calças de moletom e os tênis de sempre. Agarro-me à minha cara de paisagem e saio. Velhas e velhos esquálidos me olham com jeito de "onde saiu isto"? E eu tenho certeza de que estou virada em um pudim gigante, só me vem à cabeça Nicki Minaj cantando "I got a big fat ass". Sim, queridinha, mas tem o resto todo no lugar! Então pshhhhh.

E aqueles potinhos que levava para casa com o que sobrava da festa? Franceses, vocês não tiveram infância...















Não tenho culpa de que de onde eu vim, nas festas de aniversário, não se fazia o bolo contando a dedo o número de fatias com o número de convidados. Provavelmente minha mãe teria gostado disto, lhe pouparia das milhares de recomendações. 



Eu comendo qualquer coisa saudável.


Chegou a hora de correr atrás de todo o prejuízo, voltar a caber naquelas roupas escrupulosamente arrumadas no armário. E como quero fazer isto? Correndo de dia e comendo chocolate de noite, cruzes!! Ainda bem que na próxima semana o Fabian vai começar a almoçar na escola, o que me dá três dias inteiros, e duas manhãs só para mim (nesta escola não há aula nas quartas e sextas à tarde). 
Já fui olhar uma academia que fica a uns 5 minutos a pé, portanto, a parte de se mexer já está pensada. Meu problema é e sempre foi a alimentação: comer verduras, cortar doces, diminuir o sal... comer frutas... Mas reconheço que vou precisar mudar se quiser fazer as pazes comigo e deixar de parecer o boneco de Olinda desfilando na rua. 

Seria trágico se não fosse cômico ou vice versa

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