domingo, 9 de agosto de 2015

Bipolar/Apolar

A água escorria pelas minhas mãos. Sempre achei  hipnótico  lavar coisas. Limpar, lavar. Esfregar. Colocar detergente na esponja, apertá-la como se fosse esganar alguém até sair espuma e escorregar pelos dedos. Sempre que lavo louça escuto da voz a mesma frase: polar dissolve polar, apolar dissolve apolar. O mantra que guardei das aulas de química, assim como o movimento característico dos pés do professor para frente e para trás, como se estivesse balançando-se em uma cadeira imaginária, mantendo um giz em cada mão. 
É inútil questionar o porquê de tantas coisas que poderia a memória ter guardado, só consiga me lembrar desta fatídica frase. E já nem sei se a gordura é polar ou apolar, mas sei que é por isto que é mais fácil retirá-la com detergente e quase nada de água. 

quarta-feira, 29 de julho de 2015

Parem o mundo que eu quero subir!

Escrever já foi minha terapia. Agora é mais como se eu fosse aquele paciente estranho dos filmes que gasta uma hora em silencio olhando para o psicólogo. A ansiedade de que a vida avance é como um pano de fundo, a gente pode fingir que ela não esta là, mas é impossível fingir o tempo todo. Nos sabotamos ao não colocar nossos medos para arejar, qual trapos surrados quiçá molhados pelas lágrimas que não conseguimos deixar ir.
O mundo pára para que nós desçamos e continua. E continua. E continua a rodar. E nós ficamos ali parados, olhando as pessoas e suas vidas em janelas virtuais, vivendo seus dramas e conquistas, alheios de que os observamos com inveja. 
Há momentos em que pensamos em desistir, outros em que a raiva é tanta que rogamos pragas a qualquer um que ouse sorrir perto de nós. E depois há momentos em que desinflamos e não conseguimos sentir nada. Deixamo-nos ficar à deriva de expectativas, hipnotizados pelo mundo que gira e continua apesar de nós. 

Prazer, eu!

Quando estou triste eu:

(  ) Procuro um amigo otimista para conversar

(  ) Lembro que outras pessoas tem problemas piores que os meus

(  ) Saio para dar uma espairecida

(X) Ouço "Behind Blue Eyes" em looping

(X) Leio comentários de sites de jornal para perder de vez a fé na humanidade.

No one knows what it's like
To be the bad man
To be the sad man
Behind blue eyes..



domingo, 26 de julho de 2015

Sonho de sábado

O Fabian era um adolescente e tinha desaparecido. Lembro-me de suas costas e dos cabelos curtos, quase raspados, mas não vi o seu rosto. Aliás, fazia tempo que não o via, talvez ele estivesse se apagando pouco a pouco, diluindo-se em uma rotina das coisas que pediam para continuar. As pessoas olhavam-me como se me conhecessem há décadas, mas ninguém era-me minimamente familiar. 
Fui convidada para a cerimônia de encerramento do liceu (segundo grau) para discursar em nome do meu filho. Subi no palco e olhei aquelas expressões juvenis ainda tão leves, sem qualquer preocupação sobre o futuro. Eles me conheciam das freqüentes idas e vindas na escola por conta do mau comportamento do Fabian, ele era um rapaz muito inteligente, diziam, mas muito arruaceiro. Envolvia-se em brigas e discussões, certa vez até mandou um colega para o hospital. E agora tinha sumido...desapareceu sem qualquer sinal. Lembro de olhar para baixo e falar no improviso sobre a espera, sobre a dúvida se algum dia iríamos nos reencontrar. Era para ele estar ali, mais um rosto entre tantos rostos sem preocupação sobre o futuro...Mas ele não estava. Pedi permissão para cantar um trecho de uma música brasileira "La Bella Luna" e não desafinei: a noite passada você veio me ver, a noite passada eu sonhei com você. Duas vezes. E acordei com a sensação estranha de que aquilo tudo foi muito real para ser só um sonho. Escutei a música umas dez vezes sem parar.


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